terça-feira, 10 de março de 2015

Mais um desses encontros da vida

Ontem, atravessando a rua, esbarrei com uma daquelas pessoas que você nem se lembra onde conheceu e tem que se esforçar para lembrar o nome. Era algo como Bianca ou beatriz. Poderia também ser bruna. Tanto faz. Ela sorriu e perguntou trivialidades de respostas automáticas como “tudo bem?” e “como vai o trabalho?”. Retribuí todos os seus sorrisos e respondi cordialmente as perguntas vazias, embora não tenha me estendido no chatíssimo papo de elevador, mas então ela me fitou por alguns segundos como quem quase hesita, quase trava, mas algo a fez mudar de ideia e eu sabia o que viria depois disso. E veio. Ela me perguntou sobre você.
Eu não estava preparado. Na verdade confesso  que nunca estive. Como se preparar para dizer em voz alta o que tenho negado para mim mesmo por tanto tempo? Como olhar nos olhos de alguém, mesmo que um alguém qualquer, e confessar que sua alma gêmea se foi? E você se foi. Não por consequência do destino, mas por escolha. E essa é a parte que mais dói. Essa é a parte que deixo quietinha, no canto mais escuro dentro de mim e evito mexer, evito reviver, exceto nas madrugadas de insônia – essas malditas – quando a garganta não segura mais,  a cabeça não segura mais, o coração não segura mais e eu te vomito em pensamentos dolorosos de saudade e raiva.

E lá estava eu, parado, patético, cansado e mudo, revivendo a sua ausência, no meio da rua, observando os carros passarem, as pessoas passarem, a vida passar, implorando calado para que alguém me salvasse daqueles longos segundos que me esfaqueavam lentamente.
Ninguém veio em meu resgate. As pessoas só se compadecem de quem sangra. Mas eu sangrava. Dentro da minha casca – agora oca e vazia – que gentilmente ainda chamo de corpo, eu espirrava sangue, manchando paredes e memórias. Embora sorrisse, aquele sorriso já nada mais dizia. Eram só dentes, que antes te mordiam a bochecha, mas que agora enfileiravam toda a minha agonia da sua inaceitável partida.
Não haviam lágrimas para secar. Não haviam provas a serem evidenciadas para que aquela quase estranha me deixasse em paz – embora eu soubesse que palavras como “paz” eram pedidos grandiosos demais – eu as usava.
Eu queria que o mundo me esquecesse; eu queria poder eu mesmo esquecer de mim; assim como você me esqueceu. Então me ensina. Me ensina como apagar as lembranças que diariamente me levam à loucura. Me ensina como tirar você de tudo o que eu vejo, lembro, sinto. Me ensina como tirar você de tudo o que eu sou; de tudo o que restou. Me ensina como não ser mais você; como não ser mais nós. Me ensina como lembrar de quem eu era antes de você. Me ensina que há um “antes de você”. E depois ensina eles. Ensina como é não sentir nada. Porque as perguntas sobre você, meu amigo, um dia elas ainda me matam.

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