terça-feira, 30 de abril de 2013

Enquanto você não chega

Assim é o Nosso Amor
                   Um Amor Que Não Pode Ser Vivido
                   Intensamente.
                   Não Se Sente  no Toque
                   Não se Enxerga no Olhar
                   Mas...
                   Um Amor que Se Move Em
                   Palavras e que Cresce a Cada
                   Dia ,
                   Cuja Distância não Impede e Não
                   Diminui o Desejo de querer estar juntos!
                   Um Amor Forte que Vence a Distância
                   Tropeça nas Curvas da Saudade que Por
                   Maldade nos leva as Lágrimas
                   Mas São Lágrimas de Vida sedenta Por
                   Amar
                   São Lágrimas ansiosas que esperam por você
                   São Lágrimas de Amor esperando Por Nós
                   Dois!
                   Eu Sei...Você não Vai Demorar
                   A Qualquer momento juntos estaremos
                   Realizando a outra Parte Do Sonho
                   Que envolve nossos Corpos
                   Que envolve nossos beijos
                   Que envolve abraços
                    Desejos...
                   Enquanto você não Chega... embaixo
                   Dos Lençóis escrevo nossa Poesia
                   Derramo sobre nós lindos versos
                   Apaixonados!
                   Enquanto você não Chega...Te Vivo
                   Assim...Te Sentindo Dentro de Mim!

domingo, 28 de abril de 2013

Eu sou Bandido

Não quero nem saber, sou bandido amando. Miro e atiro o olhar, roubo o coração e o mantenho em cárcere privado de abraço. Seqüestro a paz, deixo-a presa no peito da minha amada. A liberdade é meu objetivo, pois tenho o direito de ficar preso a quem eu quiser. Munição engatilhada, inspiração na agulha, puxei o desejo, apontei a direção. Atirei o primeiro verso, acertei o olhar, brilhou, nem tive tempo de mais atirar, morremos de amor juntos quando você me beijou.

sábado, 27 de abril de 2013

o amor além da vida

Ela possuia longos cabelos castanhos e vestia-se como uma rainha, ou melhor, como a preciosa princesa imaculada da Pérsia. O rapaz contemplava sua beleza a distância, enquanto ela se banhava no rio. Então ele se aproximou e a disse:
_Annelise, aonde posso encontrar a chave para entrar em sua vida?
_As águas cristalinas deste rio irão dizê-lo!
_Como podem as águas falar ou dar sinais, minha princesa?
_Arthur, nem o rio nem o mar podem falar, mas a natureza pode sim se comunicar! O vento canta a sua canção, as folhas das árvores caem indicando que estamos no outono, as estações se modificam e o tempo decompõe tudo. A água dissolve tudo que permanece nela por muito tempo. Se puder me amar pela minha alma e minha essência, então as águas do rio dissolverão a nossa pele, mas nunca dissolverá o nosso amor. Porque o tempo passa e envelhecemos, mas somente o verdadeiro amor permanece intacto e forte, como grandes muralhas que não fraquejam com os ventos. Se realmente está disposto a me amar então venha e me ame nestas belas águas cristalinas e que aqui permaneçamos até que não nos reste mais corpo, mas sim duas almas unidas pela eternidade! Caso seu amor não seja verdadeiro, se entrar nestas águas elas o afogaram e você perderá o ar, ninguém poderá salva-lo e você morrerá devido ao seu coração impuro.
O rapaz entrou naquelas águas sem medo, pois a amava verdadeiramente. Ele a amou e ali permaneceram até que não se pode mais suportar e seus corpos para o pó voltaram, mas seu amor não se decompôs nem mesmo com a morte!
(SOBRE METÁFORAS)

Eu sei

Ei, você. É, você mesmo. Eu sei que você ama alguém. Sei que você pensa muito nessa pessoa, e tudo te faz lembrar dela. Sei que quando você olha pro nada, é ela que lhe vem à cabeça . É olhar pra nada e pensar em tudo. Sei que você já prometeu à si mesmo que não iria derrubar mais uma gota de lágrima se quer por ela, mas acabou não cumprindo.
Eu sei que a voz dessa pessoa te conforta, e o abraço dela é o melhor do mundo. Sei que você ama o cheiro dela, e poderia acordar todos os dias com esse cheiro ao seu lado, te abraçando, com um sorriso sonolento dizendo “ bom dia ”.
Sei que muitas músicas poderiam ser a trilha sonora de vocês dois.
Eu sei que você pede conselhos aos seus amigos, mas acaba não seguindo nenhum, porque apesar de tudo você ainda quer ter ela de volta, e traz o sentimento todo junto com ela. E você não liga, porque quer viver tudo de novo. Eu sei que toda noite você se despede dessa pessoa em seus pensamentos, já na vontade de dizer “ não esquece de aparecer nos meus sonhos ! ” , e aparece, porque é o que você quer. Sei que essa pessoa é idiota, insensível, complexa , complicada , mas você não se importa, porque é exatamente isso que te faz gostar mais e mais dela. Eu sei que em cada linha desse texto, você estava com a mesma pessoa na cabeça. Porque só quem já amou alguém de verdade sabe o quanto isso dói. !!

A bendita rede social


   Ele olhou a foto dela e achou que fosse uma miragem. Ficou encantado imediatamente e sentiu que alguma coisa o atraia naqueles olhos castanhos e naquela boca pequena. E quanto mais ele admirava aquela fotografia mais tinha vontade de admirar de novo. Havia qualquer mistério nela, qualquer coisa escondida por detrás do sorriso esplêndido. Não dava pra explicar tamanho fascínio. Foi uma questão de minutos, ou melhor: uma questão de segundos pra que nascesse dentro dele uma grande simpatia pela jovem. Embora ele não soubesse quase nada a seu respeito além das informações básicas que constavam ali naquela rede social onde todas as pessoas desconhecidas tornam-se amigas de uma hora pra outra. Será que era mesmo possível gostar de alguém que você nunca viu?

     Ele jamais imaginou que aquilo pudesse acontecer. Nunca foi de se apaixonar com facilidade, tampouco acreditava em amor a primeira vista. Sua única fase de romantismo foi apenas na adolescência, mas depois de tantos amores não correspondidos e de tanto sofrimento em vão, ele achou desnecessário passar por tudo isso na vida adulta. Já estava mais do que na hora de por o pé no chão e parar de ficar alimentando fantasias. Sendo assim ele cresceu tornando-se uma criatura fria e reservada, não costumava se apegar demais a qualquer pessoa que fosse, mesmo quando tinha ciúmes não deixava transparecer, embora raramente isso acontecesse.  Seus poucos namoros se é que se pode chamar assim foram rápidos e sem grandes emoções ou sentimentos exagerados. Na maioria das vezes a paixão só durava enquanto não havia envolvimento...

   O amor e a paixão viviam muito mais dentro de sua própria cabeça do que em qualquer outro lugar, pois na vida real as pouquíssimas experiências que vivera só tinham servido pra que ele aprendesse a ser homem. Dessa forma ele aprendeu a beijar, aprendeu a fazer caricias e tudo que vem depois disso, mas nunca conheceu o verdadeiro amor. Naquele momento ao olhar aquela foto ele mal sabia o que fazer. Não sabia se ficava a vida toda suspirando ou se escrevia uma mensagem. E a freqüência com que entrava no bendito site aumentava cada vez mais. Foi ai que ele chegou a uma conclusão: todas as pessoas que ficavam muito tempo na internet nem sempre ficavam por diversão e sim porque se sentiam extremamente solitárias.

     A rede social que vira e mexe mudava de nome nada mais era do que uma válvula de escape onde as pessoas compartilhavam sua solidão umas com as outras. E quanto mais elas trocavam emails, cartões ou mensagens, quanto mais amigos virtuais elas encontravam, mais a solidão se manifestava... É claro que ninguém jamais admitia, porque ali todos eram felizes e bem resolvidos e todos, ou pelo menos a grande maioria viajava pra lugares diferentes. Todos aqueles rostos, aqueles nomes e sobrenomes, todos eles tinham a mesma coisa em comum: eram carentes de afeto, de amizades e principalmente carentes de paixões. E no fundo a maior esperança de quase todo mundo era justamente a mesma: conhecer ali a fada encantada ou o príncipe encantado de suas vidinhas vazias...

      Alguns buscavam relacionamento, outros buscavam aventura e uma meia dúzia queria apenas divulgar seu dia a dia e ter alguém do outro lado pra fazer comentários. Era reconfortante saber que as demais pessoas iriam consolá-lo, parabenizá-lo pelo seu aniversário, dizer que suas fotos eram bonitas, que sua família era engraçada, que seus dentes eram brancos. Nada como ligar um computador e ter a certeza absoluta que você tem grandes amigos e que no fundo sua vida nem é tão ruim assim. Só que um belo dia você levanta com pé esquerdo e a máquina para de funcionar. E onde estão seus amigos? Onde estão suas paixões? Foi pensando em tudo isso que ele desligou tudo e foi se deitar afinal já passava da meia noite, mas a lembrança da foto e daquela moça cujo nome ele não conseguia esquecer, permaneceu em sua mente.    De onde ela era? Onde morava? Tinha marido? Filhos? Qual era o signo dela?

   Ao contrário das pessoas de sua lista ela não era do tipo que escrevia frases bonitinhas, não aparecia em festas, nem ficava paparicando ninguém. Entrava e saia da rede sem fazer qualquer comentário, mantinha-se neutra e era como se nem existisse. Sua lista de comunidades aumentava com certa freqüência. A maioria era sobre livros, música e arte em geral... No perfil só constavam três ou quatro informações: uma delas é que ela fazia faculdade, trabalhava numa loja de eletrodomésticos e morava com os pais. Era muito interessante saber de tais coisas... Na sua imaginação ele a via voltando da universidade com vários cadernos na mão e um ar cansado. Toda universitária realmente elegante no seu modo de pensar prendia os cabelos em um coque, usava uma blusa social branca e óculos no rosto. Mas aquele era o visual de uma executiva. Concluía.

   Um dia ele pensou em mandar uma mensagem pra ela só pra puxar assunto, nem que fosse pra falar do calor ou apenas dizer oi, tudo bem. Só que na hora de escrever a coragem sumia. E depois de um tempo ela nunca mais ficou online. O que teria acontecido? Provavelmente ela andava muito ocupada, ou então tinha arrumado coisa melhor pra fazer. Então os amigos da sua amada começaram a postar palavras de despedida em sua página de recados. Em todos eles a seguinte frase: Sentirei sua falta. Não dava pra saber ao certo se ela tinha ido viajar ou se tinha morrido... E assim ele passou dias e noites sentindo a falta dela, mesmo sem conhecer a dita cuja. Sonhou com ela dentro de uma banheira, mas no sonho não havia nudez, pois a espuma cobria tudo e no meio da espuma havia pétalas de rosas.

   O rosto dela estava mais angelical do que nunca, sua pele era lisa e perfumada, macia e cheirosa. Sua voz era aveludada e ela sorria de vez em quando. Era um sorriso tímido, inocente. Um sorriso que enchia seu coração de esperança. Seus olhos possuíam um brilho especial e ela o abraçava com ternura. Seus segredos eram todos desvendados e eles dialogavam na semi-escuridão do quarto. Que sonho maravilhoso aquele, pena que a realidade foi tão diferente. Depois de muitos meses sem dar noticias ela finalmente reapareceu com novo visual e com várias fotos ao lado de um namorado. Embaixo das fotos ela colocou a seguinte frase: Nos conhecemos numa viagem. Que bom pra você, pensou ele enciumado e decepcionado. Uma onda de tristeza o assaltou e por muitas noites ele não dormiu.

    A internet foi a pior coisa que inventaram. Só uma pessoa muito idiota pra perder tempo com esse monte de futilidade que não nos leva a lugar nenhum. Quer saber, vou procurar coisa melhor pra fazer de agora em diante, pensou ele. Mas movido pela curiosidade ele fez o contrario do que tinha prometido. Olhou novamente as fotos, leu outra vez as legendas e concluiu depois de um suspiro: Quem dera o sortudo fosse eu. Mas infelizmente ninguém estava livre de um amor platônico, nem de uma paixão inesperada e quando isso acontece não importa quantos anos você tem.

Vem que a gente te espera, a vida é tão bela, o amor se revela, e ainda sim, muitos não podem ver

“Tudo o que é bom dura tempo o bastante para que se torne inesquecível.
Chorão
 MUSICA DE FUNDO NO SITE DO ESCRITOR
 
A vida é engraçada, muitas pessoas acreditam que ela não passa, principalmente o jovem. Acham que vivemos para sempre, falam em emprego, carreira e posses; para elas o tempo não passa...
Uma quantidade seleta de pessoas sente o tempo passar e tem um amor maior à vida, um apego a momentos bons. Para esse seleto grupo de pessoas as disputas do dia a dia, o reconhecimento e os prazeres do poder e do dinheiro, não interessam tanto como a forma que essas pessoas vivem suas vidas.
Paulo Gomes é uma dessas pessoas. Ele nasceu na Bahia, Caravelas, mas não esquentou nenhuma cadeira lá, veio para Vitória tentar emprego, junto com a família pobre, formada de pai, mãe e irmão menor.
A família tinha uma loja de móveis usados em Vila Velha, foi o que conseguiram depois de vender a pequena casa de herança em Caravelas. Ele cuidava da loja enquanto o pai e o irmão saiam para comprar os móveis velhos e surrados, cheios de mofo, que traziam parte da história ruim das casas que deixavam. Paulo podia sentir isso, a velha crestadeira, a cadeira de mesa que ninguém quer, cochão que em muitas noites dormiram amantes que não se amavam mais. Paulo odiava aquilo, não se importava em ser o segundo filho,*** o filho não amado, mas ficar no meio daquelas coisas era assustador!
Tinha tempo para ler. Todos perguntavam:
- O que esse menino vive lendo?
Havia imobilidade e a solidão. Uma solidão familiar que só uma criança pode perceber: não ia ao parque, ao cinema, nem mesmo à praia; todas as diversões eram de adulto, quando tinha. Ele se isolou no mundo dos livros e da música.
Tinha um dom que a família não reconhecia. Alguém sempre dizia:
- Já ‘tá esse menino cantando novamente!
Ele cantava, cantava muito, sua voz foi considerada pelos colegas parecida com a do Tim Maia. Nomes e comparações, porém, trabalham no cérebro negativamente: para Paulo a comparação com Tim Maia levou-o a ser um obeso em uma família de magros, acabou engordando, ficou simpático e famoso na cidade.
O pai continuava trabalhando com o irmão na loja, mas na vida moderna ninguém vende nem compra móveis usados. Seu comércio foi deteriorando como um tomate ao sol e... Murchou.
Depois, com a insistência dele, todo o patrimônio foi levado, até que veio a pobreza, perdeu tudo, ficou quase na miséria e aos quarenta e cinco anos trabalhava como faxineiro de uma loja autopeças junto com o filho mais novo.
Quando o pai estava com cinquenta anos, caiu da escada e quebrou a quinta vértebra lombar; se Paulo fosse perverso, diria que o pai se atirou de lá de propósito. Ele ficou com o andar carregado, mas conseguiu andar. Aposentou-se por invalidez, estava a salvo do vexame da faxina na loja de autopeças do amigo.
O filho mais novo, Denis, acostumado com a proteção do pai não cresceu. Diz um ditado que filho que é protegido vira bandido! Denis foi pego assaltando uma loja, a policia o prendeu e, na cadeia, por sua arrogância, espancaram-no até à morte.  
Paulo o deixou lá, nessa época ganhava dinheiro cantando, não quis ajudar o irmão, disse:
- Deixa lá para se arrepender.
Quem se arrependeu foi Paulo! Ele até ficou triste quando o irmão morreu! A morte de Denis foi um desgosto para o pai.
Paulo continuava cantando, sua música foi apreciada dentro e fora do Brasil. Visitava o pai e a mãe, mas criou um ressentimento, afinal sempre achou o seu pai um fracassado, cheio de auto-piedade, que era um coitadinho, vivia rezando. “Pai fracassado tem que sofrer mesmo”, pensava Paulo – fracassou comigo e com minha mãe".
Apesar do dinheiro gordo que ganhava com a música, não ajudava os pais, nunca ajudou.
Usava droga e tinha uma personalidade maluca, ora ficava chorando pelos cantos, pensando em todos os problemas que arrumava para os outros, pensava na condição do pai e da mãe.
Como não ajudava os pais, hora se achava o máximo, um cara perfeito que tinha uma voz maravilhosa! Tinha uma família bonita, era casado com Fabíola e tinha dois filhos, Leo e Renata; dava o que era bom para os filhos igualmente, sem tirar de um e dar para o outro.
Quando o pai caiu de cama e sua mãe se virava para cuidar dele, sem assistência médica, sem plano de saúde, Paulo ia lá só para ver o sofrimento do velho... Sentava num banquinho e via o velho deitado, com fralda, sem dentadura, esmorecia, derretia como um pedaço de fruta podre. Ele não ria, levava um frango assado e nunca ficava para comer, ia comer camarão. Que se dane o velho, que se encha de frango assado comprado na calçada!
A vida é muito maluca, quando se tem tudo, não falta nada, o que lhe faltou na infância continuava faltando, tinha que beber para esquecer e nem sabia o que. Paulo ficava dentro do banheiro fumando e depois caia na droga, até entrar no palco. Cantava, embelezava a vida dos outros, mas a sua vida mesmo estava um desgraça, tinha vontade de voltar lá e falar com o pai, dizer que não deveria ter esquecido que ele existia na infância, que deveria gostar da música pelo menos; ele queria que o pai fosse o avô de seus filhos e ao mesmo tempo queria o velho longe das crianças! Uma contradição que piorava quando usava drogas.
- Fabíola que mala é essa?  - disse Paulo olhando as malas da mulher.
- Vou embora! - disse olhando-o diretamente nos olhos. Falou que ia largar a droga, não largou, quatro internações, nove ou dez acompanhadas de vinte mil mentiras!
Ela estava com os olhos cheios de água:
– Você é um bom marido, não me trai, é um bom pai, famoso, rico, tem tudo e coloca tudo a perder com as drogas!
- Porra, você está fazendo um drama, o que eu faço é só pra calibrar, nem sou viciado nem nada, isso não é moralismo? - disse segurando o braço de Fabíola. – Você não conta, mas que sei que já usou.
Fabíola olhou para ele com raiva, ele conhecia aquele olhar, conhecia a mulher, só queria ser feliz, que ela o deixasse ser do jeito dele, nem ficava tão chapado assim, ele precisava em alguns momentos Quem não usa drogas?
Fabíola tirou a mão dele do braço.
- Escuta – disse ela pegando as malas – Já usei, já fiquei doida, mas saí dessa, por amor aos filhos e, de alguma forma, amor a você também. Querido, a autodestruição tem limite! Olhe, algum dia vou encontrar você caído em um quarto, morto de tanto usar drogas, não quero viver sob essa sombra, prefiro cair de uma vez, para ter tempo para me levantar.
-Cair por quê?
Ela chorou.
-Por que eu te amo, porque vejo o que faz com o seu pai, porque vejo que não é feliz, porque você faz o que o seu ego gigante manda, porque você está nesse caminho sem volta para as drogas! Por tudo isso.
Disse e saiu com lagrimas nos olhos.
Paulo não acreditava porque o mundo estava contra ele, porque as pessoas não entendiam as necessidades dele, só tem uma regra moral, ninguém entende a dificuldade de viver, é monstruoso estar vivo, depender de pessoas e locais, amar coisas e hábitos e assim mesmo saber que vamos morrer. Ninguém entende o quanto ele tem medo do destino do pai, como sofre em ver-se no lugar do pai, deitado na cama tendo a sua bunda limpa por uma velha de sessenta anos que, por acaso, foi o amor de sua vida e com quem você andou de mão dada! Ninguém entende um sofrimento que não seja a privação do dinheiro, privação do afeto verdadeiro, da amizade verdadeira, do amor verdadeiro e da infância verdadeira!
Muitas vezes quis ser pobre novamente. Agora, tinha tudo e não faltava nada: um sofá, uma TV, os livros, o aparelho de som, a casa no bairro nobre tudo ficava sem sentido... Ligou o aparelho de som e começou a cantar, foi até ao sofá e deitou, pegou o papelote e fez um preparado. Hoje queria sentir novamente aquela liberdade de vida, do corpo, não queria sentir aquela dor do abandono, o lugar de ninguém.
Carlos, o baterista de sua banda, que pela magreza e por ser um ser gosmento, tinha o apelido de – Lombriga - com muitas espinhas na cara, cabelo grande fora de moda, agia assim: quando alguma coisa não tinha mais chance de piorar, Carlos aparecia para pior um pouco mais.
-Tua mulher te deixou? - perguntou Carlos.
-O que você quer, Lombriga, sai que hoje quero dar os tiros sozinho. – disse Paulo fechando a porta. Foi quando Carlos mostrou o saquinho com comprimidos.
-Aqui ó, se eu for, isso vai junto – disse de forma maliciosa.
-O que tem ai?
-Vai me deixar ficar? Posso te ajudar, fiz dois períodos de psicologia.
Pessoas sozinhas são insistentes por companhia, Carlos era assim.
Sentados, Paulo tomou um dos comprimidos e falou:
-Meu pai está mal.
Disse sem se preocupar com a resposta de Carlos:
 – Acho que ele já pagou pelos erros. Seu pai, Carlos, como é?
-Legal pra caralho! - disse enquanto enrolava o baseado.
-Então porque você ficou essa merda?
-Sou merda não. - disse Lombriga invocado – Sei lá, sorte, acaso, muitas coisas de graça, sei é que o meu velho era sensacional.
-Essa coisa toda não é culpa do pai – disse Paulo – olha para você, não estudou, se droga, faz um monte de cagada e tem um pai bom, tá de sacanagem, ‘né? Pelo meu, a culpa todinha das merdas que faço são do meu pai.
Lombriga já estava tonto.
-Teu pai gostava mais de você, cara, sempre vi isso, achava você forte – disse Lombriga quase caindo – Você é que invocava com coisas da infância! Lombriga entregou o cigarro a Paulo e disse:
-Volta para tua mulher, larga a droga, cigarro e essa porra toda, não fica querendo ser o seu pai ou evitando ele, larga disso, eu não tenho nada, nem aparência, nem a tua voz, nem pais para reclamar, faço o que faço porque sou um bosta, sei é que faço o que me dá na telha, ou sou um bosta social e um cara legal para mim mesmo, agora você não, você tem mulher e filhos.
-E dai?– disse Paulo.
-E daí que não pode jogar tudo fora – disse Lombriga, mas não estava tão certo assim.
-Talvez você esteja certo, o problema é como vou fazer isso e ser feliz à minha maneira – disse Paulo.
Naquela hora, porém, todas as incertezas caíam na sua cabeça, todos os problemas, todas as contingências caiam na cabeça dele, todos saiam de perto, todos só sabiam falar o que ele deveria fazer, como se fosse fácil! Tudo caía, tudo, agora ele procurava alguém para ajudá-lo, só tinha o Lombriga! Até tinha mandado bem, mas todas as pessoas que diziam amar Paulo tinham desaparecido, então só restava fugir.
Ele sabia que era um covarde, mas os outros também sabiam disso.

A treva e a Luz


 
Era uma vez duas amigas que viviam em uma pequena vila, e que tinham nascido exatamente no mesmo dia e à mesma hora. Uma chamava-se Treva - cabelos e olhos do negro mais negro, tão negro, que à noite, o céu sentia ciúmes das estrelas, pensando que elas poderiam querer ornar os cabelos de Treva. Ela usava sempre negro - nas roupas, sapatos e acessórios. Sua fala era rouca e mansa, e sua atitude, sempre taciturna. Apesar de preferir a escuridão, ela às vezes gostava de passear à luz do dia, mas logo se recolhia, pois algumas pessoas não gostavam de topar com ela pelas esquinas da vila.
 
Luz era muito bela, e tinha olhos azuis cristalinos e pele alvíssima. Vestia sempre branco, e sua fala era alegre e cheia de vida. Adorava ficar à luz do sol, e evitava as noites muito escuras, pois temia que sua alvura fosse contaminada pela escuridão.
 
Mas havia uma hora do dia em que Luz e Treva sempre se encontravam, pois não estava tão escuro assim que fosse ferir a sensibilidade de Luz, e nem tão claro que fosse ofuscar os olhos de Treva: era a hora do crepúsculo. Ao por-do-sol, as amigas se encontravam em uma colina e colocavam em dia os seus assuntos. Eram muito unidas, embora fossem tão diferentes.
 
Um dia, chegou à aldeia um jovem cavaleiro, que pertencia à corte. Belo e garboso, segundo diziam, procurava por uma dama que lhe servisse de esposa. Assim que ficou sabendo de sua chegada, Treva ornou-se com seu véu negro bordado de fios de luar, seu vestido de veludo mais negro e seu colar de ônix. estava linda! Esperou até que escurecesse, e ficou à porta da taverna onde o cavaleiro se divertia com os amigos, aguardando que ele saísse. Assim que saiu da taverna, Juno - este era o nome do belo cavaleiro - diante da linda visão de Treva, que lhe sorria, apaixonou-se por ela. Chegando perto da moça, apresentou-se e os dois ficaram conversando até o dia amanhecer. Ao raiar do sol, Treva despediu-se de Juno e foi para casa. 
 
Juno foi sonhando com a beleza da moça pelo caminho, totalmente enlevado, achando que tinha finalmente encontrado a esposa perfeita! Linda, profunda em seus pensamentos, discreta, apaixonada. Mas de repente, ao virar a curva, deparou com outra dama tão bela quanto Treva: Luz esperava por ele, displicentemente sentada a uma pedra. Vestia o manto mais branco, bordado de fios de sol. Seus cabelos loiros e macios, ornados com pedrarias douradas e azuis, espalhavam-se em volta de seu rosto alvo como se fossem raios, e seu sorriso claro e meigo imediatamente capturou a atenção de Juno.
 
Sentando-se com ela na pedra, os dois conversaram até a hora do crepúsculo, quando Luz despediu-se dele e foi ter com Treva no alto da colina, como sempre faziam. Juno seguiu para a estalagem aonde se hospedara, totalmente divido entre Treva e Luz. Chegando à colina, Luz imediatamente contou à Treva sobre seu novo amor:
 
-Conheci alguém!
-Eu também!
-Ele é o mais lindo jovem que já vi em minha vida!
-O meu também! Passamos muitas horas juntos, conversando, e acho que estamos apaixonados!
-Nós também! Meu amado pertence à corte!
-O meu também! E ele é um cavaleiro do Rei!
-O meu também é! E seu nome é Juno!
-Não pode ser!
-Mas... por que não?
-Porque meu amado também chama-se Juno!
-Mas eu o vi primeiro!
-Não! Eu o vi primeiro! Nos conhecemos à noite!
-Mas nós nos conhecemos ao raiar do dia!
-Falamos por horas e horas!
-Nós também! E ele adorou meus olhos azuis!
-E meus olhos negros!
-Você mente!
-Você mente!
-Ele é meu!
-Não é não!
 
Assim, Luz e Treva começaram uma batalha que duraria eternamente.

À noite, Treva mostrava a Juno todo o seu encanto e paixão, envolvendo-o completamente por seu manto negro bordado de luar, e durante o dia, Luz o envolvia em sua pureza e sua doçura, cobrindo-o com seu manto branco ornado de fios de sol.
 
Treva e Luz passaram a odiar-se mutuamente. Esperavam que Juno logo tomasse sua decisão a respeito de qual delas seria sua esposa, mas o jovem parecia cada vez mais indeciso. Pressionado por ambas, incapaz de tomar uma decisão e não desejando ferir nenhuma delas, Juno partiu da cidade numa fria tarde de outono, sem sequer despedir-se. Deixou, a cada uma, um bilhete de adeus.
 
Dizem que até hoje Treva e Luz são inimigas mortais, e uma se acha sempre bem melhor que a outra. Esqueceram-se do quanto ambas são importantes, e mesmo devendo encontrar-se todos os dias, ao crepúsculo e ao amanhecer, suas discussões são sempre tão acirradas que tingem o horizonte de vermelho.
 
O homem carrega dentro de si a Treva e a Luz até os dias de hoje, e em certos momentos, deita-se com Treva, enquanto em outros, acorda com  Luz.

Haicai 3

Eu amo de modo infantil
Ela disse: SOME! Eu somei
Eu disse: SOME! Ela sumiu.

Haicai

Aprender eu preciso
Que lágrimas quando caem caminham
Para onde nasce um sorriso.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

a história da bela e o coveiro

 No mundo sujo e perdido vivia o moço órfão de nome Jurandir, que não sabia contar estórias. Em meio à lama suja do cemitério clandestino em um imenso terreno baldio, ele enterrava os cadáveres das vitimas dos malditos. Vitimas de assassinos impiedosos e serial killers, que matavam inocentes e arrastavam os cadáveres para o moço sepultar. Vivia sim na eterna escuridão, sem saber do amor ou das coisas bonitas que cantam por ai. Ele não era feio nem belo, era apenas o moço sujo que enterrava cadáveres e comia com as mãos imundas de sangue morto. 

 Em outro mundo limpo e florido vivia Bela, a moça bonita como o nome. Seus pais eram floristas e ela cultivava as mais belas rosas em um jardim tão grande quanto o cemitério clandestino de Jurandir.
 Mesmo sendo moça bonita, ela nunca teve um grande amor. Passava seus dias a despetalar margaridas em um ritual de “mal me quer, bem me quer” para assim saber se um dia encontraria os olhos de seu amado.

 E enquanto Jurandir abria covas rasas para sepultar cadáveres destrinchados, degolados e baleados, a moça abria buracos na terra fértil para plantar suas rosas que sempre eram apreciadas e premiadas por todos. Dois mundos e duas condições totalmente diferentes. Mas o que é do amor sem a magia? O que é da vida sem dois focos, duas visões e dois pensares? 

 Embora sujo, o mundo sombrio de Jurandir era culto e digno de proezas. Muito aprendia com os assassinos maquiavélicos que lhes traziam cadáveres para sepultar.
 Um serial killer Argentino que matava pessoas que imploravam pela vida, lhe contou entre uma tragada e outra que os mortos um dia voltariam a vida e perseguiriam seus algozes, e ele que um dia os enterrou, poderia ser parte desta vingança suja.
 Jurandir apenas sorriu e sepultou de bom grado o velho baleado que o Argentino trouxe. O enterrou em uma cova muito mais funda que a de costume e disse aos risos:
— Pois este vai ter mais trabalho para sair e buscar por sua vingança!
 Não era soberania, tampouco desrespeito, mas ele bem ouviu os conselhos do Argentino. Desenterrou centenas de cadáveres e cavou covas mais fundas, para assim garantir que não mais conseguiriam sair do descanso eterno.
 Sim, Jurandir era desses que ouvia tudo o que diziam, não era a toa que enterrava os erros dos outros e pouco ganhava para isto. E foi graças a este grave e sagrado defeito, o de ouvir o alheio, que ele conheceu Bela.
 Uma velha maldita denominada Dorotéia assassinava mulheres grávidas, tudo porque nunca pariu uma criança. Um dia, chegou ao cemitério arrastando o corpo de mais uma de suas vitimas. Jurandir a recepcionou com um sorriso e uma cova aberta, a velha atirou a grávida na valeta profunda e ajudou o moço a sepulta-la, enquanto dizia:
— Sabe, seu cemitério é belo e cheio por dentro, assim como a barriga de uma gestante. Eles estão todos aqui debaixo da terra, como fetos podres prontos para eclodirem... Mas por fora... Por fora só vejo a lama e o vazio.
 Jurandir olhou seu cemitério plaino. Nada alem de pequenas cruzes permanecia sobre a terra úmida. Ele sorriu diante da brilhante percepção e perguntou:
— O que achas que falta aqui, velha e sábia Dorotéia?
 Dorotéia que mais parecia uma bruxa colocou a mão no queixo cumprido e falou:
— Faltam flores e velas. Mais flores do que velas. Mortos gostam de receber flores avivadas e perfumadas.
 Jurandir sorriu encantado com a brilhante dica. De imediato, comprou sementes e mudas de flores, plantando as mesmas sobre a terra morta, para assim agradar seus cadáveres.


 Que tristeza... Jurandir não sabia plantar a vida, apenas a morte. As flores eclodiam e logo morriam, e das mudas plantadas despencavam as folhas e elas secavam mortas como todos os pútridos cadáveres.
 E ele sonhou. Sonhou que acordou. Acordou em meio à carne fétida dos cadáveres cobertos de varejeiras e flores mortas. Tentava fugir da desgraça que era a carniça dos podres, mas seu pé enfiava em meio a ossos, carnes e poças de sangue imundo. Ele gritou e de sua boca brotou uma rosa negra como a noite. Tentava arranca-la de sua boca, vendo fartos bigatos se deliciarem com a carne de seus dedos. Apodrecia junto com os mortos, perdendo o ar dos vivos.
 Acordou em desgraça, se afogando com a própria saliva, ciente de que tinha que dar flores aos mortos.
 Foi então que ouviu noticias sobre Bela, a moça que tinha a mão boa para cultivar rosas.

 Bela em seu jardim florido cuidava das tulipas quando ouviu os pais anunciarem a presença de um estranho. A moça caminhou serena até a porteira e o viu. Jurandir coveiro estava lá, com o corpo sujo coberto de barro seco. As unhas grossas e afiadas tinham terra por baixo. Ele de súbito encontrou os olhos de Bela. Tremeu de medo e foi ágil em dizer:
— Vim por conta das flores, das rosas que crescem em abundancia em seu jardim.
 Bela olhou atenta nos olhos do moço sujo. Viu pureza em suas palavras, viu o branco que cercava a bola negra e brilhante. Sim, tinha vida e beleza às palavras e a alma do moço, ela de súbito também se encantou e respondeu:
— Planto rosas desde menina. Elas fazem parte de mim...
 O moço atrevido mesmo sem ser convidado atravessou a porteira de madeira, adentrando nos domínios de Bela. Aproximou-se dela e com o coração disparado e perguntou:
— E em meio de tantas rosas consegues tu se encontrar? Elas não invejam sua beleza? Ou será que se inspiram nela para crescerem prosperas e bonitas?
 Bela ficou tão vermelha quanto suas rosas. Sorriu tímida e perguntou:
— E você vive do que, moço?
 Jurandir tímido arrancou o chapéu e baixou a cabeça. Olhando para a terra fértil que pisava contou:
— Vivo de plantar morte e de seguir conselhos. Um desses conselhos me trouxe até aqui no seu mundo. Vim comprar rosas prontas, para plantar sobre os mortos que enterro em meu mundo.
 Bela que nunca havia perdido ninguém que amava, não sabia o que era a morte. Mesmo assim, lhe sorriu e lhe apresentou seu jardim:
— Na direita ficam as tulipas, as margaridas e algumas outras qualidades diversas. A esquerda tem meu xodó, as rosas, rosas vermelhas, brancas e simplesmente rosas. Meu grande orgulho, pois nada no mundo é mais belo que elas.
 Jurandir olhou ao longe as rosas. Com o coração pulsante tocou com as unhas sujas de terra o rosto de Bela e disse:
— Bela, tu certamente és mais bela que todas elas...
 Bela com as mãos limpas e bem cuidadas levou a mão por sobre a mão que acariciava seu rosto. Fechou os olhos e deixou-se levar por outra coisa que não conhecia: O amor.

 E Jurandir mal viu o tempo passar. Perdeu-se em meio ao jardim florido, esquecendo-se da triste realidade que o aguardava em seu mundo. Passou uma tarde agradável ao lado da moça e de seus pais, bebendo chá e conversando sobre a vida.
 Sim, a vida, não a morte que ele tanto aprendeu a se adaptar, e sim a vida, o cotidiano que encanta os que sabem apreciar o que á de bom.
 Foi para seu mundo com caixas e mais caixas de rosas belas, pronto para planta-las por sobre as covas profundas.
 Lá chegando, deparou-se com uma pilha de cadáveres. Os assassinos cruéis e impiedosos não descansam como os mortos. Enquanto Jurandir contemplava sua amada, eles ceifavam vidas e traziam as carcaças para ele enterrar.
 E no momento que os sepultava, Jurandir chorada, descobrindo que até então nunca viveu, pois sua grande alegria em toda a vida foi a tarde agradável que passou ao lado da moça Bela.
 E em meio à noite chuvosa, enterrou os corpos e plantou as mudas de rosas.
 Há, que tristeza... Todas elas morreram quando as raízes encontravam a terra lamacenta e morta... Jurandir gritou em meio a toda sua desgraça, vivendo em seu mundo o pesadelo sem fim.
 Dormiu na lama dentro de uma cova rasa. Dormiu e acordou triste, testemunhando o terreno coberto por flores secas e murchas.
 Sim! Bela tinha a mão boa! Talvez se ela as plantasse... Talvez se as plantasse com suas próprias mãos, elas prosperariam avivadas, fazendo do lugar feio uma bela paisagem... Elas eclodiriam e encheriam de beleza o cemitério, o deixando tão fértil quanto seu jardim!

 E Bela munida de sementes e mudas, entrou de mãos dadas com o moço Jurandir no cemitério clandestino e lamacento. Ela pela primeira vez sentiu medo, medo do cenário macabro e grotesco, medo da morte, morte esta que ela nunca conheceu de perto, diferente do moço que sepultava cadáveres.
 Bela viu com tristeza as flores murchas e secas plantadas por sobre as inúmeras covas. Em lagrimas, caminhou em meio às covas cobertas de lama, segurando a mais bonita muda de rosa.
 Ajoelhou-se diante de uma cova e com estrema delicadeza, abriu um buraco em meio a lama e colocou com cuidado a muda de rosa.
 De súbito a flor viva vibrou, como que se quisesse se despetalar. O talento e o dom da moça que tinha a mão boa para plantar foram mais fortes que a morte predestinada da terra infértil. A rosa teve forças e desabrochou triunfante na lama, tornando-se ainda mais bonita que antes.
 O solo tremeu e as raiz seca e forte da rosa morta se esticou em baixo da lama, correndo de encontro às outras raízes mortas das flores plantadas por Jurandir. O grande milagre.
 Jurandir sentindo a terra molhada tremer sobre seus pés, temeu que a profecia do Argentino tivesse se cumprido... Sim, ele temeu que os mortos voltassem à vida! 
 Não era isso. As flores mortas que ele plantou de súbito se avivaram. Os talos secos ficaram verdes e novas e vistosas folhas preencheram o vazio das outras. Era mágica! Era milagre! O cemitério morto ficou florido e vivo, coberto de folhas e rosas coloridas!
 Jurandir se encantou e entre sorrisos, abraçou a moça Bela. Bela o apertou forte no abraço e encostou sua testa na dele. Jurandir tremeu de um medo que nunca teve, e ignorando a insegurança, a beijou docemente. Foi correspondido. E em meio ao cemitério florido, amou intensamente sua moça, enquanto uma nova pilha de cadáveres se amontoava no cemitério clandestino.
 E foi assim por dias. Jurandir sepultava os cadáveres em covas profundas enquanto Bela os cobria de rosas e flores férteis. 


 Um dia Jurandir decidiu que não mais queria o pesadelo de seu mundo. Não queria mais sepultar a morte como um coveiro, queria viver de plantar flores no mundo de sua moça, tornando-se assim um jardineiro.
Pediu Bela em casamento e decidiu viver com ela em seu belo jardim. Bela em extremo encanto disse sim, o moço se tornaria limpo e viveria com seu grande amor até o fim de seus dias...

 No entanto, Jurandir sabia que não iria ser fácil. Sabia que a corja de assassinos e psicopatas seguia um líder, um homem com interesse em comum aos deles, o homem que encobria todos os seus crimes e que pagava migalhas para o jovem coveiro enterrar toda a sujeira. Seu nome era Sandoval, o líder de toda a corja de malditos.
 O humilde rapaz foi cabisbaixo até a mansão do magnata informar sobre sua saída, deixando Bela no cemitério, arrumando as malas para a partida.
 Sandoval estava reunido com a corja de assassinos imundos para ouvir o pronunciamento do moço apaixonado, que em mágicas palavras tentava lhes convencer sobre sua saída.
 E o mafioso ouviu com atenção os dizeres do rapaz. Ouviu e riu, riu e gargalhou das bobagens do amor. Todos os assassinos cruéis riram também da condição do garoto. E ele que queria viver as bobices do amor, riu da própria tragédia, na esperança de sentirem piedade e lhe deixarem sair vivo dali.
 Pois não se pode alcançar os céus se você esta com os dois pés no inferno. O moço corajoso apanhou por seu desatino, apanhou da corja que um dia protegeu e ajudou.
 O Argentino impiedoso mirou a arma em seu peito e sorriu. Jurandir olhou fundo nos olhos do homem que esperava que ele implorasse pela vida. Não implorou e mesmo assim recebeu um balaço bem no meio do peito.

 Foi jogado sem vida em meio aos outros cadáveres no cemitério clandestino. Bela tremeu de pânico e medo, vendo seu amado morto e ensanguentado. Chorou em desgraça, sentindo pela primeira vez a dor da perda.
 Ela separou o amado morto em meio aos outros corpos empilhados. O lavou com ternura e o cobriu de flores frescas. Chorou e após vela-lo em tristeza e inconformismo, se preparou para sepulta-lo em uma cova rasa.
 E pela primeira vez Bela plantou a morte, bem no meio do cemitério clandestino e florido. Pela primeira vez enterrou algo que estava morto e que jamais brotaria, por melhor que fossem suas mãos...
 Então, carros estacionaram na frente do cemitério clandestino. Em extrema ousadia, Sandoval desceu de um dos carros pretos, junto de seus assassinos sanguinários. Ele caminhou em desatino com eles até o meio do cemitério. Olhou para a bela moça e disse em sarcasmo:
— Jurandir não mentiu. Não era a toa que queria trocar de coveiro para jardineiro! Você realmente é muito Bela, capaz de virar a cabeça de qualquer homem! Viemos para o funeral, mas vejo que já o sepultou junto de suas outras flores.
 Naquele instante a terra tremeu. Tremeu forte e voraz, enquanto os malditos boquiabertos testemunhavam as covas floridas se abrirem em crateras.
 Para desespero dos assassinos, os mortos errantes enterrados na terra molhada escavavam com suas unhas, querendo sair de suas covas. As flores se despetalaram e a cova recente de Jurandir se abriu também. Sua mão brotou da terra e os assassinos tremeram do mesmo medo que suas vitimas. 
 Jurandir levantou-se de sua cova. Olhou a sua volta, os mortos das covas fundas também despertando de seus túmulos, fazendo valer a profecia do Argentino, seu algoz.
 Os assassinos impiedosos tentaram correr, em vão, as mãos pútridas e ossudas que brotavam da terra seguravam em seus pés, eram os mortos que ressuscitavam serenos e firmes em suas vinganças.
 O sangue quente dos vivos era aparado pelas bocas podres dos cadáveres famintos. Jurandir em ira pulou no pescoço do Argentino e o destroçou entre seus dentes...
 O inferno e a carnificina pairaram sobre o cemitério florido. O magnata Sandoval foi destrinchado por dezenas de cadáveres famintos, fazendo valer o dom da vingança. Gritava em desgraça para ser liberto da dor da morte, morte esta que por décadas ele cultuou. 
 Bela tentava escapar da ira dos cadáveres que tentavam também devora-la, foi ajudada por seu amado, que ainda preservava a consciência dos vivos.
 Poucos assassinos conseguiram escapar da fome dos mortos-vivos, e entre eles, estava Dorotéia, a bruxa sádica que matava mulheres grávidas. 
 Bela beijou seu amado vivo como suas rosas... Sim! Vivo! Jurandir estava vivo, pois sua amada tinha a mão boa para plantar...

 Lhes digo que o amor salvou o moço que sepultava cadáveres. O amor verdadeiro sempre salva, sempre cura, sempre liberta. O amor é mais forte que a própria morte, e foi bem ela, a Morte, que tocou flauta no casamento de Bela e Jurandir.
 O amor germinou forte e triunfante no coração dos dois, assim como a filha semeada pelo casal. Bela trazia a felicidade em seu ventre, e em meio às flores e a harmonia de seu mundo, estava prestes a dar a luz a Rosa, a primeira filha.

 No entanto, um sombrio espírito de vingança adentrou no mundo de Bela e Jurandir. Era ela, Dorotéia, a maldita velha bruxa que tinha gana em assassinar grávidas. Dorotéia corroída pelo ódio, finalmente descobriu o paradeiro do moço que dizimou grande parte da corja de assassinos com seus cadáveres.
 Era noite de lua cheia. Uma faca longa e afiada estava prestes a entrar no útero de Bela quando a bruxa imunda invadiu o quarto do casal. Jurandir que não sabia matar, abriu os olhos para o perigo e despertou, flagrando a silhueta da bruxa armada com a faca. Ele lutou insano contra a velha traiçoeira, que era muito mais forte que ele.
 Dorotéia era monstruosa e estava determinada a semear o mal, entre bem sucedidos golpes, dilacerou varias vezes o braço do moço desarmado. Este, no intuito de proteger sua amada, não teve outra escolha a não ser degolar com as próprias mãos o pescoço seco da velha Dorotéia.
 A bruxa maldita deixou a faca banhada em sangue cair. As unhas que tanto cavaram covas, entraram em sua jugular e a estrangularam. Jurandir deu seu ultimo presente para a Morte, um cadáver que ele jamais iria sepultar, pois foi isto que prometeu.
 
Existe uma gigantesca e rara arvore de ipê com três cores de flores plantado em meio às terras onde vivem Jurandir, Bela e suas filhas Rosa, Violeta e a pequena Margarida.
 O ipê onde esta talhado o nome do casal, foi plantado próximo ao pequeno milharal.
 Jurandir e sua esposa se reúnem todas as tardes de sábado lá com suas meninas, fazendo um alegre piquenique.
 Em meio ao milharal existe não um espantalho, mas sim uma bruxa seca e esturricada, esticada em uma cruz para espantar os corvos. Essa é uma das historias que o moço aprendeu a contar para suas filhas. Conta sobre uma corja infame que tentou lutar contra a liberdade do amor, de um rapaz que sepultava os mortos e de uma princesa que semeava a vida. Esta historia fala de amor e de terror, e ambos misturados, são tão doces como uma musica nostálgica. Há... O amor... Ele sempre prevalece sobre o terror!
 
 

quinta-feira, 25 de abril de 2013

A maldição da bruxa


Em 1847 Solange Kells foi enforcada naquele terreno, a bruxaria era considerada crime sem perdão naquela época, suas ultimas palavras antes de falecer foram. Suas gerações imundas vão me pagar por isso.

164 Anos depois 2011.

Era dia de festas para os calouros da faculdade, pois sua aceitação havia sido ótima na faculdade John e Mayara festejavam, Lucio o play boyzinho da turma tinha um ótima casa de Praia e convidou John e Mayara para irem com ele para aquela casa de praia, os dois aceitaram e gostaram da idéia para se familiarizarem com a turma toda.

Chegando à casa todos foram se divertir alem de John e Mayara havia também Lucio e seus amigos João e Paulo.

A noite chegou e como de costume uma fogueira foi ascendida ali no local, o que eles não sabiam que exatamente naquela sexta o fantasma de Solange Kells voltava à vida em busca de vingança.

Como de costume ao redor de fogueiras, começaram a rolar historias macabras sobre o local. Disse Lucio tentando colocar medo em todos.
- Essa casa e muito sinistra já morreu muita gente aqui, por isso meu pai conseguiu um preço bacana ao comprar ela.

Já ficando assusta com a historia Mayara disse.

- Deixa de ser trouxa Lucio.

A hora foi passando e quando era exatamente 00h00min horas todos foram se deitar, as luzes da casa já estavam apagadas quando a alma de Solange Kells surgiu, o espírito já estava repleto de ódio e rancor queria vingança a tudo custo.

Lucio dormia quando ouviu um barulho pela porta dos fundos da casa, ele então se levantou para averiguar o que estava acontecendo, quando estava descendo a escada viu um vulto passar em sua frente voltou rapidamente, mas quando abriu a porta de seu quarto se espantou com a bruxa que tinha marcas no pescoço e seu rosto já estava deteriorado, ele tentou gritar, mas ela o estrangulou e o atirou pela janela.

Com o barulho do corpo de Lucio caindo pela janela as demais pessoas acordaram, todos se reuniram na sala para ver o que estava acontecendo, do lado de fora da casa eles puderam presenciar o horror, o corpo de Lucio estava pendurado em um arvore todo deformado e do lado dele estava a bruxa.

O espanto tomou conta de todas naquela sala as luzes da casa se apagaram e todas as portas se fecharam impedindo assim que eles saíssem daquela casa.

Se quer saber o final desse conto fique esperto que em breve vai estar disponível

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Lados opostos da sociedade

Com relação ao homossexualismo ou qualquer caráter sexual, sim, caráter, porque não é opção, todos sabem que a alma já vem moldada, então não pode ser uma opção, minha opinião é uma só e simples. Sou a favor de todas as personalidades sexuais, porque por existir várias pessoas que gostam do mesmo sexo que elas, consequentemente acharão alguém para amar e ser feliz. EU SOU A FAVOR DA FELICIDADE E SOU TOTALMENTE CONTRA A SOLIDÃO!

sábado, 20 de abril de 2013

My only future

Era mais uma noite na qual eles trocaram mensagens de texto até um deles adormecer. Nesse dia, ela adormeceu primeiro e quando acordou, se deparou com mensagens que diziam um pouco de como aquilo tudo tinha começado.
02/01/2013 - 23:21
“Ah! Sei que você já tá dormindo, então não tem problema eu te encher de mensagens... Mas eu preciso de alguma forma te dizer tudo o que não consigo (e talvez nunca consiga) te dizer pessoalmente. Então ai vai...”
“Uma vez, no fim do semestre passado, eu entrei na sala do Diogo e vi você sentada e, por incrível que te possa parecer, foi como se eu tivesse te visto pela primeira vez: não conseguia lembrar que já tinha te visto antes em algum lugar.” “E mesmo com a impressão de já ter te visto antes, eu não pude deixar de ver o quão fofa você estava no dia.
Após esse dia, eu não via a hora de o semestre virar, porque eu não sabia que aquela turma era tão pequena, e arranjei essa desculpa quando extraordinariamente naquele dia entrei na sala.” “Contudo, no fundo eu sabia que estava prejudicando o Diogo em tirar uma turma dele, mas não dava mais pra não querer você num horário em que eu pudesse te ver (E olha onde chegamos e onde chegaremos).
Na época eu já estava livre de Lola, mas estava me deixando levar de novo pela Pamela.” “Não sabia seu nome até então, ai dei umas indiretas no Diogo e descobri... Liguei pra sua casa, falei acho que com sua avó e te coloquei na minha turma, tudo intencional. Inclusive, dividir aquela turma já estava predito antes de começar o semestre.”
“Mas enfim, lembro até hoje do primeiro dia de aula... "Hello, my friend! You're Debora, right? You're my student." E confesso que apesar de ter me sentido atraído desde o inicio, me apaixonei de vez na primeira semana. Coloquei na cabeça que você teria de ser minha, porque você foi feita pra mim.”
“Quando descobri que você namorava, fiquei duplamente desapontado comigo mesmo. Um: por ter me apaixonado por alguém dita impossível. E dois: por não conseguir desistir de você. Arranjava a desculpa de que ainda valia a pena sua amizade, por ser minha aluna e tal, mas ‘just friends’? De onde saiu essa frase que você detesta? Era óbvio que não era só isso pra mim!”
“E agora eu começo a penúltima parte desse livro. A parte em que te peço desculpas por ter me infiltrado na sua vida sem direito a isso, e ter te feito terminar seu namoro. E peço desculpas também por tudo o que fiz até então que te desapontou, e por tudo o que sei que vou fazer.” “Sei que farei porque sou ciumento, e demorei tanto pra achar alguém como eu que também tenha me achado que fico com medo de perder esse alguém.
E na ultima parte, eu te agradeço por tornar minha vida maravilhosa, por não me deixar ser enrolado pela Pamela de novo, e por tornar meus dias diferentes.” “E eu queria te agradecer por tanta coisa, que não sei por onde começar (nem sei se tem inicio, meio e fim)... Eu queria te agradecer por aceitar fazer parte da minha vida, por ser uma das pessoas no topo da minha lista de melhores pessoas do mundo!” “Melhor pessoa. Melhor amante. Melhor futura namorada, noiva e esposa. Melhor futura mãe dos meus filhos. Meu melhor futuro. Meu único futuro. Você é o meu caminho, a minha verdade e para sempre a minha vida. E obrigado por tudo isso! Eu te amo DEMAIS! You're my girlfriend. Real or not real?”
“Aceita ser para sempre minha, só minha e de mais ninguém? A mãe dos meus filhos, dona do meu destino e eterna parceira e amante? Aceita dividir comigo suas dores e felicidades até nosso ultimo segundo? Aceita ser chamada de minha esposa e eterna namorada? Aceita se casar comigo?”

Um Amor Inventado

Ele gravava seu nome numa pedra, enquanto ela dizia: - Não. Esta pedra é minha. - Ele mesmo assim, insistentemente continuava a escrever. Mais que isso, ele marcava, perfurava, quebrava, dava formato àquela rocha amorfa.
Ela dizia: - Esta pedra jamais será sua, pois ela me pertence, está em meu nome, e as suas mãos jamais serão capazes de torná-la posse...
- O tempo passou, e ela viu que não era mais dela, e que seu coração estava transformado, totalmente dele. Ele deu vida àquela escultura e chamou de amor. 

As vezes o amor precisa de despedidas, para não ser eterno

Eu não me importo com o seu relógio com os ponteiros sempre atrasados. Não me importo com os bares e lugares que você escolhe. Eu já não te espero, nem te acompanho. Não me importo com as vírgulas mal empregadas e as frases que você não sabe formular. Não aguardo nenhuma mensagem, nenhuma carta num corpo de e-mail. Não me importo se o telefone não toca, se nenhum alerta pisca. Não espero resposta. E para mim não faz diferença se você se importa, não há nada de novo nisso.

Eu, que sempre me incomodei com cada detalhe, encontro-me agora em estado de indiferença. Velho amor é passado, mas é sempre amor, apesar de mudar a forma e agregar a ele outros sentimentos.  Mas isso não tem nada a ver com o que eu penso a seu respeito, aliás, quase não penso. Ignoro cada gesto, cada encontro casual, cada bom-dia com sorrisos amarelos – atitude de dois estranhos familiares.  Finjo não ver, porque é melhor que sorrir.

Era minha melhor amiga, mas hoje somos bons desconhecidos. Dois adultos que não sabem viver sem se esbarrar, sem desviar os olhares. Que conversam no silêncio, na distância, na mudança de vida, na troca de amores. Somos apenas duas crianças que não aprenderam que para seguir em frente, com quem quer que seja, é preciso perdoar. Não se pode ser apenas um quando os nós não foram desatados. Mesmo que nada mais de nós realmente importe, é preciso saber olhar nos olhos e dizer tchau, para que finalmente possamos dizer olá, sem medo.

Eu não me importo com nada em você, com nenhuma mania. Não te quero comigo, nem espero que você me dê a mão. Desejo apenas que um dia possamos agir sem culpa, que saibamos, pelo menos, não desviar os olhos. Em algum momento, eu sei que finalmente aprenderemos a amar de novo, depois de encarar os anos que não vivemos, apenas remoendo, levando todas as angústias e frustrações do nosso amor antigo para nossos novos amores. E antes de pedirmos perdão a quem quer que seja, que perdoemos a nós mesmos por invalidar qualquer possibilidade de fazer feliz outra pessoa. Por culparmos os outros pelos nossos próprios erros.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

A verdadeira princesa dos olhos verdes e azuis ( Chore se precisar)


Tive em minha juventude – reconheço - grandes alegrias, momentos de exultantes felicidades. Momentos eu digo, porque a felicidade não é um sentimento que “mora” conosco, ela nos visita, portanto é uma visitante. Nós a hospedamos, damos-lhe cama e mesa, todo nosso amor e carinho, afagos, toda a nossa atenção, imploramos-lhe que permaneça junto a nós, que fique mais um pouco, mas se resolver ir embora, ela irá. Nada, nem ninguém, força humana alguma a segura dentro de nós. A felicidade é uma grande e generosa amiga, mas temperamental. Tem sua vontade própria. E outra coisa, não aceita superficialismo artificial: bebidas, drogas e estimulantes. Ela se vai do “hotel” desta vez de forma definitiva. Leva junto outros hóspedes vizinhos, deixando o “prédio” vazio, e em ruinas. Não importando se a hospedagem era nova ou mais velha. Ficando cheia de fantasmas agressivos.
Por isso é lugar comum, mas pura verdade, quando dizemos: “a felicidade é feita de momentos”. Temos “momentos felizes”, que na maioria das vezes não chega a um dia inteiro. Outras vezes a felicidade é mais duradoura e nos dá uma “colher de chá”, permanece conosco semanas, até meses, mas não digam que foi de modo contínuo, ininterrupto.
A constância e a plenitude da felicidade é uma mentira. Nós todos temos uma meia felicidade, porque é da natureza desse sentimento não ser completo. E, o que não é completo não pode ser uma verdade. Sabemos que uma meia verdade ou uma verdade faltando um pedaço, é uma mentira. A verdade ou é inteira ou não é uma verdade. Assim não seremos meio felizes, mais ou menos felizes. Ou somos ou não somos. Como o caso daquela de Alexandre o Grande. Não existe Alexandre o Médio ou o Mínimo. Ou será “o Grande” o nenhum outro.
Assim acontece com a felicidade, e a quem diz que vive uma felicidade plena, ininterrupta, completa como fosse uma obra de arte acabada. Está mentindo! Ou para enganar a si mesmo ou aos outros. Muitas pessoas, para disfarçar sua frustração, decepção ou fracassos perante os anos, a carreira e a vida em si, acenam com a bandeira da felicidade incondicional.
Sabemos que não. Também sabemos que é possível ter o maior número de momentos felizes que pudermos na vida. Isso é verdade! A vida é uma sucessão de fatos díspares, como pedras: umas mais lisas, outras mais rústicas, algumas com arestas e pontas. Nem todas são seixos rolados.
Podemos preparar nossa mente, sede de nosso espírito, alma, de forma que eles sejam cada vez mais receptivos aos momentos felizes. A escala de valores a que atribuímos à felicidade é muito importante, se pequenos momentos nos alegram a alma é muito mais fácil obtermos maior número de momentos felizes do que aqueles que colocam muito alto os objetos de desejo. Os seus custos podem - e quase sempre - estão fora da realidade em que vivem. Disse-nos o Grande Mestre “Não vos preocupeis com o dia de amanhã...” ou “De que vale ganhardes o mundo inteiro e perderdes vossa alma?”, ou para Jonas, que se estafava no deserto, ao encontrar um pé de hera, se acolheu á sua pequena sombra. De repente essa hera secou e morreu. Jonas em desespero se lamentou e lamuriou-se. Deus lhe fala: “Jonas, por que se lastimas por um pé de hera, o qual tu não plantaste, não regaste e da mesma forma que nasceu, morreu?” Assim somos todos nós. Preocupamos com o futuro, que de incerto não nos pertence. Ou ganharmos fortunas, sermos avarentos com o que temos se amanhã podemos perder a alma vivente que está em nós, que também não nos pertence e sermos como se diz: “Mais vale um cão vivo, do que um leão morto”. Ou lastimar a perda de bens ou coisas as quais são transitórias, muitas das quais, não plantamos nem regamos, foi nos dada pela Graça? Eis a felicidade. Como foi dito: - de Graça!
Na minha juventude, mais do que na fase adulta, fui sensível à busca da felicidade, porquanto as frustrações estavam de plantão me esperando para golpear. Mas sempre cultivei a busca e a leitura do belo. A busca do “saber ver” nos ajuda a encontrar o belo, a coisa, as pessoas que nos podem fazer felizes. Picasso disse: - Eu não procuro (o belo), eu o encontro.
Dessa forma, passei uma juventude com o maior número de momentos felizes que a maioria de meus amigos ricos, e eu sendo um auxiliar de sapateiro, cujo oficial era o meu pai. Estou inicialmente dedicando estas linhas, para dizer que busquei encontrar a beleza em todos os cantos. Sem pretensão de jactância ou proficiência alguma.
O que não nego e me mantém esperançoso até esta idade foi ser teimoso, persistente, perseverante, nunca tendo dó de mim mesmo vida afora, quando sabia que: “aqui no alojamento têm baratas aos montes, no acampamento escorpião é praga (de fato era) naquele alojamento os pernilongos levam a gente embora (milhares), a macarronada de ontem veio com barbante (aconteceu), a cabeça do frango veio com bico e tudo (idem, e com o milho do papo também.)  – se fosse o caso, diria a cidade o ano e o local, onde os fatos aconteceram.
Já na prática profissional, estar do lado de cá do cano de uma arma de um marginal, não é nada confortável (mas tudo passa). Isto "na busca de meu caminho" como escreveu Gorki em: “Ganhando o meu pão”.
Mas voltando no decurso do tempo, descobri que o desenho era uma arte em si, com começo meio e fim, e, que seu desenvolvimento com dedicação era um caminho para atingir a beleza. Desde bem cedo comecei a dar bastante importância às aula de desenho no Colégio. E freqüentar aulas de desenho com o Professor Cação. Passei do desenho geométrico, que é a forte base para as perspectivas, linhas de fuga, proporções, formas e massas e volumes que ocupam o espaço, passei ao desenho artístico, que desenvolvi o mais que pude. Juntamente, sem desprezar nenhuma matéria, investi com muita dedicação também, às aulas de português. Passei a ser um bom aluno no geral, e ótimo em desenho, português e geografia, pois nesta matéria, me interessava muito saber os nomes de todos os acidentes geográficos, que formavam a paisagem dos países, os climas, estações, relação campo-cidade, rios, florestas, campos, cerrados e demais tipos de terreno que forram o planeta e os povos, pois iria num futuro fazer somatória com o desenho. Interessa-me também muito, o retrato. Ou seja, retratar no desenho, pessoas. Isto também tinha um objetivo mais imediato. Tinha a intenção de fazer o retrato da garota: de olhos verdes e azuis.
Os intervalos de uma série de aulas (e até hoje) eram chamados por nós de “recreio”. O recreio para mim, era como disse, um “momento de felicidade”.
Enquanto o presidente do “Diretório Acadêmico dos Alunos” colocava os discos de Elvis Presley e os rapazes mais ricos, saracoteavam tentando na dança do “Rock and roll” imitar Elvis - para chamar a atenção das garotas é claro - eu nem bola dava para isso, estava ou retratando uma garota, ou lhe fazendo uma poesia. Muitas, se sentavam ao meu lado, tão juntinhas de mim que lhes sentia o calor do corpo.“Momentos felizes”! Outras me pediam para ajudar-lhes nos desenhos, rosáceas, barras gregas, acharem os pontos de fuga, determinar a linha do horizonte, ou mesmo no “desenho do natural” obter as devidas proporções à folha de seu caderno, luz e sombra etc. Até mesmo no francês, idioma que tinha uma facilidade natural, e tinha aulas com  a Valdete Moreno (em casa, ela era amiga da família). Mas não era só as meninas que me procuravam para acudir dificuldades com o desenho ou redações alguns colegas rapazes também: um, há anos, foi Prefeito da cidade vizinha, outro já era riquinho (pais nascidos na França), herdou tudo, sendo filho único: o Alexandre Avignon. Outros se tornaram médicos, engenheiros e até um sacerdote, Frei Rui Moraes, girou o mundo e voltou a um seminário vizinho.
No futebol, como fazia com tudo, dediquei-me exaustivamente aos treinamentos, com o treinador de goleiros do Moji Mirim Esporte Clube, então para ingressar à “2ª Divisão”, que mais tarde passaria à “Especial” como está até hoje. Assim tinha um verdadeiro fã clube de garotas, que me achavam o melhor "goleiro do mundo”, coitadinhas! Era muito bom, sem falsa modéstia, mas a falta de discernimento técnico delas potencializava meu desempenho. Era certo que o “Flamenguinho” nosso time juvenil, não tinha mais adversários. Este time teve em suas bases grandes nomes como Paulo D., que foi para o Santos FC. E outros para o Guarani de Campinas e Ponte Preta, outros ainda chegaram ao Flamengo do Rio. Eu cheguei aos amadores do M.M.E.C. e o goleiro que fora meu reserva, subiu com o Moji para a “1ª Divisão”, hoje a especial. Bem, mas isto já é outra história.
Voltando às minhas atividades de jovem colegial: fazia mais sucesso com as garotas  ( apesar de ser pobre) do que os que eram mais abonados. Nos clubes, por exemplo, ia até a porta; como não era sócio voltava para sentar-me na praça e conversar sobre música com o sargento do Tiro de Guerra que era jovem e solteiro e tocava saxofone: jazz, blues, swing, música erudita e até músicas populares. Falávamos das grandes orquestras como Ray Conniff, Billy Vaughan e demais. Outras vezes junto a dois ou três amigos que iam fazer ou já estavam fazendo filosofia: Josué Rodrigues, Manoel Macedo de Lima, Antônio Carvalho e até Benedito R. de Oliveira, também filho de um sapateiro que ganhou uma bolsa de estudo e foi para Coimbra estudar Medicina - ele Benedito, era barbeiro - um dia contarei a história dele.
Chegamos a ela, a garota dos olhos verdes e azuis. Como a conheci? Ela, eu não sabia, era uma minha admiradora. Gostava de me ver jogando futebol de salão no Colégio, gostava de meus desenhos, gostava de minhas brincadeiras (sempre sadias, mas às vezes tétricas) como um dedo polegar achado na calçada do necrotério que ficava em frente ao colégio. Esse dedo eu mostrava para as meninas, um dedo já roxo e com a unha amarelada e sangue em volta. Muitas garotas tinham ânsia, outras quase desmaiavam, outras choravam de nojo e medo. Só que tinha um detalhe: a garota dos olhos - verdes e azuis - ficava curiosa e não tinha medo! Olhava para o dedão e olhava para mim. O dedo em uma caixinha. Todas as outras debandavam só ficava ela. Com seus olhos bem verdes cor de folha vegetal, me fitando e eu admirando aqueles olhos verdes tão profundos. Ela dava um sorriso e apareciam duas covinhas em cada lado de seu rosto. Ela - lembro-me bem disso - corava muito facilmente. Possuía os cabelos castanhos claros. Mais baixa do que eu, não muito. Podia usar salto alto que atingiria minha altura de 1,75, sem afetação caso andássemos juntos.
Estranho para mim, foi o fato dela não ter se assustado e ficado curiosa.  Perguntou-me com sua voz delicada muito de acordo com seu visual: “Onde mesmo você achou esse dedo?” –  havia em seu belo rosto corado e no brilho daqueles olhos verdes profundos, certa dúvida quanto a veracidade da estapafúrdia exibição.
Não resisti, disse-lhe: - Sônia, para você, eu conto como é feito isso. É meu próprio dedo que está aqui. Passei azul-de-metileno e iodo nele, pus algodão nesta caixinha cortando um lado no formato de meu dedo polegar e o acomodei dentro dela. É um truque sua boba...
- Não sou boba – me respondeu. - Porque já estava desconfiada, você não seria capaz de fazer isso de verdade... Eu te conheço!
Esse “eu te conheço” soou para mim como um “eu te amo”.
Os jovens são emotivos e impulsivos, mas são espertos também. Existem jovens e jovens. Todos que fomos jovens sabemos disso!
Passou o tempo. Sempre conversávamos no interior do colégio, no galpão do “recreio”, nos corredores. Ainda não havíamos tratado nada. Nenhuma incursão até a sorveteria (mesmo porque sempre estava sem dinheiro). Encontrávamos à noite, depois íamos comprar pipocas e sentar na Praça Central da cidade defronte à matriz (bela réplica do gótico tardio).
Interessante, que apesar da grande beleza de Sônia, comentada por suas amigas e meus colegas que diziam: Você é sortudo mesmo, que garota linda é sua namorada. A Iza, (Luiza) dizia-me sempre a Sônia é linda, você é um rapaz de sorte. Com tantos querendo conquistá-la... Mas sabem quando aquele amor afetuoso não havia chegado ainda? Até o dia em que ela me disse: - Sabe o que mais admiro em você? Respondi: - Não! A sua educação! – afirmou ela.
Refleti no peso que ela colocou naquelas poucas palavras: "sua educação". Divaguei. Ela não está elogiando somente a mim, mas aos meus pais, além de mim existem muitos outros fatores que implicam – pelo menos implicavam – quando se afirmava: Você é educado (a). Existe a criação, a família, a escolha dos amigos, a ausência de vícios, uma crença. Um modo de vida. O modo de vida conquista, pensei. Não é isto que sempre busquei? Nunca quis grandes reconhecimentos, mas esse reconhecimento era diferente. Não visava as coisas materiais, mas atingiu diretamente meu senso comum. Toda minha busca pareceu-me terminar ali. Com as palavras curtas, quase sussurradas, como era sua voz, sem corar, mas direta: “O que mais admiro em você é sua educação!" Momento intenso de felicidade!
Nas coisas do amor como diz, Rubem Alves, “fazemos amor com as palavras”. Quando se faz amor com as palavras, fazemos poesia, Sônia merecia além de meu amor uma poesia. Eu iria fazê-la e lhe entregar de surpresa. Passei a amar Sônia. Nem ela própria nunca soubera qual fora o gatilho que detonou de verdade meu amor por ela.
As palavras nos fazem felizes ou infelizes. As palavras dela me fizeram imensamente feliz. Não foram os beijos, nem os: “eu te amo”. Mas aquelas, que em outro contexto, cessariam num “obrigado”. Em coisas de amor não se deve agradecer. Estraga tudo! Disse: - Imagine. Apenas trato bem as pessoas, e você é observadora! Ela: - Não, você é especial. Admiro sua educação.
Pensei divagante, na Idade Média. Deveria ser isso que conquistava as damas, os Cavaleiros (mais tarde cavalheiros) com sua cortesia (faziam a corte). Nos séculos seguintes, o “cavalheirismo”, correr e jogar a capa para as damas passar por cima e não sujar os pés na lama. Abrir a porta das carruagens e oferecer o braço como apoio, para as damas subirem. Os genes das verdadeiras damas ainda deviam estar vivos nos corpos de muitas mulheres atuais. Porque não? Teria Sônia herdado genes que provinham desde a Idade Média. Teria eu, com esta minha tendência constante em desenhar castelos, a bico de pena (nanquim) retratar Guinevere, Lancelot, Artur, e Camelot, muitos castelos da Bretanha, França, Escócia, Gales, Portugal, Espanha, muitas donzelas e princesas, as justas entre cavaleiros e suas armaduras, executados com detalhes realistas (fiz várias exposições com desenhos de castelos medievais): “The Medieval Castle”. Claro que eram apenas divagações. Mas aumentava o romantismo, quando pensando nisso a via tão linda, usando uma tiara. Imaginava: Sônia é uma donzela saída da história e caída em meus braços.
Só a via a noite ou nas sombras dos galpões do colégio, interior da igreja, nos corredores sombreados, até porque, encontrava-me com ela de acordo com a ocasião e os momentos apresentados. Como disse antes, não havia ainda em mim um ímpeto em buscá-la, a qualquer momento.
Após as curtas palavras ditas por ela naquela noite, de cálida brisa, um vívido luar e um céu muito estrelado. Havia até certo perfume especial nela que eu sentira, mas não retivera e agora o sentia. Porque tudo compunha um cenário mágico. Vinha-me à mente: “Sabe o que mais admiro em você? - Sua educação!”
Aquilo houvera me soado com uma pureza cristalina, uma magia benfazeja e eu a beijei terna e demoradamente. Surgiu em mim um misto de carinho e fervoroso amor, um espírito de gratidão não a ela, mas às forças que me fizeram encontrá-la. Iria procurá-la mais e mais vezes agora. Eu sabia que o que sentia por ela não era outra coisa senão um profundo e cálido amor.
Certo dia, em um quente e ensolarado verão, já havia me formado, ela ainda não. Estava no último ano do então “Científico”, ela dizia que iria ser enfermeira, iria fazer a faculdade de enfermagem depois doutorar-se, embora já lecionasse música como professora particular em sua casa na Avenida Barão do Rio Branco, tocava piano (hoje chamamos de
 “teclados”), também violino, flauta e violão. Tinha estudado desde os quatro anos de idade, os doze anos exigidos para o piano e violino em Campinas, onde morava com uma tia já idosa (que se esquecia que estava no Brasil e quando falava em polonês corava como Sonia).
Encontramos-nos em frente ao Hospital da Santa Casa, o mesmo hospital que possuía o tal necrotério nos fundos, onde disse ter achado na calçada o dito polegar. Começamos a conversar e os que se amam fitam-se nos olhos – falam mais que as palavras – e eu fiquei ao fitá-la, estarrecido!...
Ela percebendo meu espanto, preocupou-se seriamente comigo, e eu a fitava e mais inquisitivo me punha. Ela dizia-me: O que foi? Fiz alguma atitude que não gostou? Está ofendido por alguém ter falado alguma coisa de mim para você? Fale comigo!
Falei surpreso e meio gaguejante. Mas você não tem os olhos mais verdes que as folhas desta palmeira (próxima a nós), ontem mesmo eu vi!? Ela se pôs a sorrir lindamente com suas covinhas no rosto e corou muito.
Sabe - como é algo que me pertence e há muito tempo, escapa de ser citado em conversas: eu tenho os olhos verdes na sombra ou à noite. E ao sol, na claridade eles são azuis.
Disse a ela: - Mas como é possível duas belezas em uma só pessoa Sônia? Na sombra seus olhos tem a cor mais verde que as folhagens e ao sol são mais azuis que este céu que vemos agora!
Ela riu: - Duas belezas! Vem ele com a educação e gentileza. Nem uma, quanto mais duas belezas!
Não lhe disse por que sua modéstia não iria concordar, mas eram três intensas belezas a compor seu lindo rosto: A de olhos verdes , a de olhos azuis, e sua alma suave e meiga, sempre pronta a agradar e a servir.
Como sempre diz Rubem Alves: Tempus Fugit. O tempo não cessa, não pára. Sônia, se forma enfermeira. Volta para sua cidade no Portal das Águas. Sua vocação para a enfermagem era tamanha que disse-me por carta que iria ingressar nas fileiras de missionários “Além Fronteiras” que iam para a África, Angola e Moçambique. Tentei demovê-la da ideia, não pela causa que era nobre, mas pelos perigos que iria correr, o tempo que isso nos roubaria, mas sobretudo pelo amor entre nós que era acima de qualquer aferição; incalculável por ser abstrato, mas dois corações sabem medir sua dimensão. Tudo já estava acertado, dizia-me na carta. Malas prontas, grupos de trabalho separados, enfermeiros, médicos, teólogos, agrônomos, dentistas...
Era irreversível sua decisão!
Queria ver seus olhos mais uma vez, acariciar aquela que tanto amava.
Ela disse-me na economia das palavras que sempre usava, que era melhor assim. Ir-se, sem me ver, seria menos traumático, estava fazendo aquilo, não por que deixava de me amar, mas ao contrário porque me amava muito, e seu íntimo, sua crença e a compaixão especialmente pelas crianças, morrendo sem nenhum cuidado, de desnutrição, pessoas que nada sabiam, nem ler, nem escrever, nem falar a própria língua dos colonizadores, o português. Ela citou-me Paulo e sua missão, seus sacrifícios, suas prisões tudo por amor às pessoas e sua fé. Paulo, o de Tarso, o apóstolo do Amor. - Por tudo isso meu amor, um dia, você vai orgulhar-se de mim!
Não tive mais argumento. Só falei: - Um dia você volta? Respondeu- me: - Voltarei. De qualquer forma voltarei, para o Portal das Águas... Voltarei!
Soube por intermédio de seus tios, que residem na cidade vizinha que comentaram na igreja a meu irmão, cunhada e sobrinhos que ela tinha feito Doutorado em Portugal na sua área de saúde.
Hoje...
Ela se encontra descansando na eternidade, na quadra 142/11 no cemitério do Portal das Águas, em seu túmulo tem uma placa de bronze com a seguinte inscrição:
DRª SÔNIA KRISTINA BARROS KOWPERIZSKY – “VIVEU PARA DOAR SUA VIDA, SEU AMOR E DEDICAÇÃO AO PRÓXIMO. A DOUTORA SONIA FOI UMA HEROÍNA.” - MISSÃO "ALÉM FRONTEIRAS", ETERNA GRATIDÃO.

Seu nome de solteira estava intacto. Ela nunca se casou. Além disso, também soube por seus mesmos tios na igreja, que ela, contraiu várias vezes malária e teve suas resistências minadas, mesmo assim disseram que ela continuou atendendo crianças e adultos contaminados com a febre, malária e doenças não dectadas e contagiosas, até que uma febre hemorrágica a atingiu. Dada sua fraca resistência, faleceu.

Derrubei lágrimas sentidas ao olhar sua foto no túmulo, seus olhos estavam bem verdes. Como se os lugares por onde andou fossem sombrios.
Ao me retirar, sob o sol daquele dia de verão, voltei-me para um último olhar - o amor não mente - a luz do sol refletia forte em sua  foto: Seus olhos estavam azuis!...