sábado, 20 de julho de 2013

Sou réu

 O julgamento estava aberto. A juíza, uma cinquentona com cara de brava, bateu o martelo.
 - Esta aberto o julgamento de Jonas Santana de Carvalho, acusado de matar á queima roupa o deputado estadual Walter Cerqueira.
  Sentado de frete á mesa de jurados, Jonas se mantinha de cabeça baixa. Por ser réu primário e não ter histórico agressivo, não estava algemado. Como advogado de defesa, Dr. Joaquim Santana de Carvalho,como advogados de acusação os três criminalistas mais conceituado do estado. Por ser irmão do réu, Dr. Joaquim se mantinha na assistência juntamente com outro advogado escolhido pelo tribunal de justiça.
 O julgamento era popular, apesar de não se tratar de um crime político, o fato da vitima ser um deputado a impressa escrita e falada estava toda no tribunal.
 Sentado nas cadeiras dos visitantes o senhor Horacio se mantinha com o semblante preocupado. Enquanto a juíza chamava o advogado de acusação para falar, ele voltou seus pensamentos a vinte anos atrás.

  - Seu Horacio! Seu Horacio! - chegou correndo um garoto de seus quinze anos, afobado em seu estabelecimento comercial.
  - Fala menino, que diabos aconteceu? Parece que viu fantasma!
  - Seu Horacio acabaram de matar Zezinho!
  Naquele instante seu Horacio pensou que fosse desfalecer. Vendo que o velho ia cair, o menino correu a pegar um banquinho para ele sentar. Zezinho era seu único filho, contava apenas com trinta e dois anos, sua mãe tinha morrido no parto e Horacio o criou sozinho. Quando o menino ( como ele se referia ao filho ) casou, tinha apenas vinte anos e fez questão que ele juntamente com sua esposa, continuasse morando com ele. Sua nora, uma boa menina, o ajudava no armazém enquanto Zezinho trabalhava de motorista particular de Walter Cerqueira, na época, já envolvido com política. Depois de se recompor ele respirou fundo, e perguntou.
 - O que você esta dizendo moleque?
 - Isso mesmo seu Horacio, ele teve uma briga com Walter que sacou da arma e deu um tiro bem na testa de Zezinho! Não estou aumentando nada seu Horacio, o corpo tá lá bem na frente da camara municipal!
 Antes de sair para averiguar aquela história Horacio chamou sua nora que até então, estava nos fundos do estabelecimento onde era a residência da família, cuidando do almoço:
 - Silvania parece que aconteceu um acidente com Zezinho, baixe as portas do armazém e me aguarde aqui.
 Silvania acostumada que era a ser sempre submissa e respeitadora do sogro, só perguntou:
 - Que tipo acidente seu Horacio? Ele bateu o carro?
 - Ainda não sei minha filha, - disse tentando não se precipitar - fique ai e não atenda ninguém, principalmente ser for da imprensa!
 Chegado ao local do crime, seu filho estava coberto com um pequeno pano branco, como o tecido era pequeno, o corpo da cintura para baixo estava descoberto, ele não precisaria descobrir o rosto para ter certeza de que aquele era seu querido e amado filho.
 O assassino já tinha fugido com ajuda de seus colegas político, nessa época Walter Cerqueira tinha sido eleito a vereador da cidade.
 Ele sabia que tinha que ser forte, tinha criado um filho sozinho e agora tinha dois netos sobre sua responsabilidade.
 O funeral tinha sido simples, mas com muita gente. O velho Horacio era conhecido e querido por muitos na cidade e seu filho não tinha um único inimigo. Naquele mesmo dia, depois das irmãs da nora a levarem até o quarto para fazê-la descansar um pouco; ele chamou Joaquim, na época com doze anos. e o fez sentar a sua frente:
 - Joaquim, o sonho do seu pai, era ver você formado advogado. Vamos fazer o gosto dele, você vai se dedicar aos estudos e se formar, esqueça as brincadeiras e o armazém. Eu, sua mãe e seu irmão damos conta, eu sei que diferente de seu irmão você nunca gostou muito do serviço aqui no balcão.
 De cabeça baixa, vestindo ainda no pequeno terno que foi ao funeral do pai, ele só concordou com a cabeça e disse.
 - Sim senhor vô, eu vou me formar advogado...
 Quando o neto se levantou ele pediu.
 - Eu sei que Jonas ainda é muito pequeno para entender tudo isso, mas me faça um favor meu menino, diga a ele que venha me ver, eu preciso falar com ele, como falei com você.
 Jonas sempre foi o xodó do velho, diferente do irmão, apesar de ter somente oito anos, quando ele chegava da escola, jogava a mochila na cama e depois de almoçar ia correndo ao armazém, ele adorava atender a clientela. Ficava cheio de vida quando o avô lhe mandava arrumar uma ou outra prateleira ao seu modo.
 Ainda com os olhos vermelhos ele entrou na sala onde o avô estava e se jogou em seus braços em soluços. O velho deixou que ele chorasse tudo que tinha para chorar e depois o colocou sentado a sua frente, exatamente onde Joaquim tinha sentado instante antes. Puxando um santinho do candidato Walter Cerqueira, assassino de seu filho, assim falou:
 - Jonas, você sabe quem é esse homem?
 Balançando a cabeça ele concordou.
 - Isso mesmo Jonas, esse é o homem que matou seu pai. A policia ainda não tem dados concretos do porque tudo aconteceu, mas as testemunhas disseram que tudo começou porque seu pai estava fumando enquanto o esperava na porta da camara. Ele odiava cigarros e deve ter reclamado do cheiro que seu pai iria  levar para o carro. Até o julgamento, com uma boa gratificação essas testemunhas vão ter esquecido deste evento... E ele se muito, vai passar pelo constrangimento de ir a jure popular. Você esta entendendo Jonas?
 - Estou sim senhor. Ele sairá impune.
 - Então memorize esse rosto meu menino, quando você crescer, você vai matar esse homem.


 A vida tinha que continuar, enquanto criança, todas as noites antes de se deitar, o velho Horacio ia até o quarto do neto, tirava da carteira o santinho de candidato e mostrava a ele, repetindo sempre que aquele era o homem que tinha matado seu pai.
 Dois anos depois do assassinato de Zezinho, Walter Cerqueira foi a jure popular. Como seu Horacio previa, as testemunhas, uma não tinha certeza do depoimento que deram na época do crime, outra estava doente no dia do julgamento e assim o, então vereador Walter Cerqueira, foi absolvido por cinco a dois.
 Na saída do tribunal, Walter Cerqueira era abraçado e parabenizado pelos amigos e parentes, enquanto um velho, seguia para o ponto de ônibus segurando nas mãos dos seus dois netos.

 Durante esses vintes anos, Joaquim estudou e se formou advogado, Jonas apesar de ter estudado, não tinha feito uma faculdade. O pequeno armazém do avô, agora era uma  rede de supermercado na cidade, onde Jonas administrava juntamente com seu avô e contava com mais de cinquenta empregados.
 Ao ouvir a Juíza pronunciar o nome do neto, ele voltou ao presente.
 - Jonas Santana de Carvalho, chegue aqui à frente para seu depoimento.
 Seguido por dois policiais ele se sentou na cadeira do réu para seu depoimento. Com as mãos sobre a bíblia, fez seu juramento.
 - Juro dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade.
 - Pode começar seu depoimento - Falou a juíza.
 - Tinha eu oito anos quando minha tia foi me pegar na escola, muito antes do horário habitual. Naquele momento eu sabia que algo muito grave havia acontecido. Primeiro pelo horário e depois, a escola era próximo de casa e costumava voltar sozinho com meu irmão. Quando cheguei na secretaria, encontrei meu irmão chorando abraçado a minha tia, que ao me ver, abriu o outro braço e me acolheu junto ao meu irmão. Naquele momento fiquei sabendo que meu pai tinha sido covardemente assassinado por um motivo banal. Nossa vida só não desmoronou porque meu avô soube conduzir a família com mãos de ferro. O julgamento do assassino do meu pai foi uma farsa. Jamais esquecerei o sorriso de felicidade dele quando terminou o julgamento. As pessoas, imprensa escrita e falada não citavam a vitima, só falavam do constrangimento do na época vereador Walter Cerqueira, alegando que ele foi a jure popular por um crime banal. Se meu pai tivesse escapado do atentado, eles seriam capaz de fazer ele pagar a bala que o distinto vereador tinha gasto com ele. Vivi esses vinte anos para fazer justiça, todas as noites eu via o sorriso daquele homem na foto de um santinho que meu avô guardava, e tinha certeza que um dia o mataria.   Enfim chegou hora. Como aconteceu com o meu pai, em uma manhã de quinta-feira, eu o esperei na saída da assembleia legislativa. E quando ele ia entrando no carro eu o parei, já trazia na mão uma foto do meu pai, mostrei para ele.
 Jonas então revelou palavra por palavra do dialogo que teve com o assassino de seu pai, antes de vingar-se:
 - Deputado, o senhor lembra desse homem?
 O deputado mal olhou a foto.fez vista grossa e entrou no carro, ignorando o rapaz
 Jonas então o segurou pelos ombros, ficando de frente para o assassino enquanto mostrava a foto:
 - Pois é deputado, esse homem se chama José Santana de Carvalho, conhecido como Zezinho. E agora o senhor lembra?
 - Quem é você moleque? - Perguntou com arrogância.
 - Eu sou Jonas Santana de Carvalho, filho mais novo do homem que você tirou a vida!
 - E que diabos você quer? Voltou a perguntar com a mesma arrogância.
 - Eu vim fazer o mesmo que você fez com o meu pai há vinte anos atrás!
 Arrancou da cintura a arma e disparou impiedoso, saciando sua sede de vingança.

 Duas horas depois do seu depoimento o jurado chegou com o veredito.
 Depois do discurso de sempre, a juíza anunciou o veredito.
  - Por sete votos a zero, os jurados entenderam que o réu é inocente.
 A imprensa entrou em pavorosa, os advogados de acusação não podiam acreditar naquele resultado. Enquanto isso, um senhor no meio de toda confusão de abraços e protestos, rasgava em pedaçinhos um santinho já amarelado pelo tempo..

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