sábado, 21 de setembro de 2013

Sessão Terror- O ultimo grito


   
  Ele estava contente com os preparativos finais do casamento. Estava tudo pronto, correndo perfeitamente como tinha de ser...
Já fazia seis meses que Flávio e sua noiva Eveline planejavam o casamento perfeito. E nos últimos dias, tiveram agradáveis surpresas. A casa já estava pronta e mobiliada, Eveline foi promovida no hospital onde trabalhava...
― É de se estranhar – Comentou a noiva, deitada no peito de Flávio – Esta tudo indo tão bem! Como poderia ser mais perfeito que isto?
― Não poderia – Respondeu ele, beijando a testa da bela noiva – Simplesmente não poderia, meu amor...
A moça se voltou a ele, e em meio a um longo beijo, o olhou e perguntou:
― Para sempre?
― Para sempre! – indagou Flávio sorrindo.
 Dia seguinte ele acordou primeiro que ela. Foi até o jardim, colheu uma rosa e escreveu um bilhete:

“Dia de buscar o terno do casamento.
Te pego as 11hs para o almoço na casa de sua mãe. Te amo para sempre...
Com amor, Flávio.”

 Caminhava a passos apressados pelo centro da cidade. Tudo que via nas vitrines das lojas o fazia pensar em sua amada. Sorria já com saudades.
Entrou na loja certa, experimentou o terno pela ultima vez antes do casamento. Estava impecável. Agradeceu o costureiro e levou o terno finalmente pronto.
 Na rua movimentada do centro, viu uma velha cigana pedindo esmola. Enfiou a mão no bolso e trouxe junto com as moedas uma pedra. Era a pedra da sorte que havia ganhado de Eveline, no inicio do namoro.
 A cigana viu a pedra e reparou nela mais que nas moedas:
― Uma ametista, não?
― Sim, ganhei da minha noiva.
― Há quem diga que uma pedra dada com amor pode trazer sorte!
Flávio riu. Colocou as moedas na palma da mão da cigana junto com a pedra:
― Minha sorte é ela, minha noiva. Fique com a pedra pra senhora.
A velha espantada perguntou:
― Esta abrindo mão da sua sorte, rapaz?
― Eu não acredito nisso... Não acredito na sorte. A sorte é só um ultimo recurso, a qual usamos quando não nos resta mais nada! Fica com Deus.
 Ele deixou a cigana impressionada e atravessou a rua. A velha pressentiu algo e foi atrás gritando:
― Ei, menino! Espere!
Ele parou no meio da avenida calma, quando a cigana estava na metade do caminho, um carro em alta velocidade veio em sua direção. Ela apertou entre os dedos a pedra e fechou os olhos, o carro em alta velocidade desviou dela e bateu violentamente contra Flávio...

 Eveline acordou de um sonho ruim. Abriu os olhos assustada, como se pressentisse a tragédia. Olhou ao lado da cama e viu a rosa e o bilhete, o leu, mas não conseguia sorrir. O celular vibrou no criado mudo. Ela o olhou perplexa, com medo de atender. O aparelho vibrava escorregando no criado mudo, até cair no chão e continuar a vibrar. Eveline o pegou e atendeu. Do outro lado da linha, um medico lhe informava da tragédia:
― O rapaz foi atropelado por um veiculo em alta velocidade... Receio ter má noticia...
 A noiva ficou em choque. Uma lagrima desceu de seus olhos, e ali, ela perdeu todos os sentidos, sem chão para pisar.

 A tarde, no funeral, Flávio estava vestindo o mesmo terno que foi buscar pela manhã. Eveline não se conformou. Lamentava insana a sorte, se debruçando sobre o caixão florido do noivo.
 A velha cigana entrou em seus trapos, chamando atenção de todos os presentes na cerimônia. Se dirigiu a Eveline, lhe dizendo:
― Seu noivo era um rapaz bom... Jovem demais para partir assim...
 Eveline nada respondeu. A cigana pegou em sua mão e continuou a dizer:
― Sei que ele é bom por que se apiedou de mim... Conversou comigo. Fui a ultima pessoa com quem falou, segundos antes da tragédia.
A velha ganhou a atenção da moça, que chorosa perguntou:
― O que quer de mim? Respeite a minha dor!
A cigana alisou seu rosto e respondeu:
― Eu não quero dinheiro não, dona... Seu noivo me deu o presente que a senhora lhe deu... Deve estar pensando por que um rapaz tão distinto como seu noivo poderia dar atenção a uma velha cigana mendiga como eu... Eu lhe digo, dona: Ele me deu a sua sorte. Talvez pensasse que eu precisava de mais sorte que ele...
Eveline se voltou à velha cigana, esta lhe devolveu a pedra:
― Pois fique com ela, moça. Sei que a sorte o abandonou quando me deu a pedra! Eu já estou velha, tenho exata certeza que o destino do carro era eu, mas como estava com esta ametista, se desviou de mim...
A velha se virou e saiu. Eveline parou pensou, e com a pedra nas mãos foi atrás dela.
― Ei! Acha que me devolver à pedra me trará conforto?
A velha cigana se virou e lhe disse, antes de continuar seu caminho:
― Traga-o de volta, talvez assim encontre tal conforto. De a pedra novamente a ele! Como da primeira vez, a sorte voltará, e o rapaz poderá ser seu de novo... Como tinha de ser...
 Eveline pensou no que a velha disse, e durante todo o funeral, não teve coragem de colocar a pedra nas mãos do noivo morto.

 Depois do enterro, a noiva não parou de pensar em Flávio e na saudade que sentia. Segurou firmemente a pedra e se lembrou do que a cigana disse:
― Traga-o de volta. De a pedra novamente a ele!
 Estava quase escurecendo e caia uma fina chuva quando Eveline pegou seu carro e foi até o cemitério. O estacionou e olhou para o grande muro.
 Subiu em uma grande arvore e de lá, desceu até o interior do cemitério.
 Por dentro, o muro era mais baixo, ela adentrou facilmente, indo até o tumulo recém fechado de Flávio.
 A noiva não conseguia dominar todo o medo que sentia, deixou a ametista sobre a terra e virou as costas, pronta para ir embora dali.
 De repente, se deu conta: Não daria certo daquele jeito. Teria que fazer como da primeira vez, teria que dá-la nas mãos de Flávio!
 E enquanto a chuva fina engrossava e a noite começava a cair, Eveline se lembrou de quando deu a pedra ao seu amado:

Era primavera do ano retrasado. Ela lhe beijou docemente e lhe entregou a ametista:
― Pra que isso? Não tenho estilingue...
Eveline riu:
― É pra dar sorte, seu bobo!
Flávio também sorriu, dizendo:
― Eu já tenho sorte, pois tenho você... Não preciso de mais nada. Alem do mais a sorte é só...
― ...Um ultimo recurso, a qual usamos quando não nos resta mais nada? – Perguntou, complementando Eveline.
― Não, eu ia dizer que a sorte é só uma desculpa pra definir boa coincidência. Mas eu gostei mais da sua definição. Vou usar ela de hoje em diante!
― E a pedra?
― Vou guardar. Pra sempre meu amor...

Agora Eveline em lagrimas, desenterrava o corpo do noivo:
― Você prometeu que iria guardá-la para sempre! Prometeu que nunca ia me abandonar! E agora eu estou aqui pra fazer você cumprir com suas promessas!

 Já era noite quando o desenterrou. Arrancou a tampa grossa do caixão perolado, beijou seus lábios frios, pôs a pedra em sua mão e como da ultima vez, disse:
― É pra dar sorte, seu bobo!
Flávio não se mexeu. A noiva triste balbuciou conformada:
― Que tolice a minha...
 Deixou o tumulo aberto e correu até o muro, se protegendo da chuva que engrossava. Tentou pular o muro baixo, mas não conseguia se erguer até o topo... Decidiu então que procuraria o portão, imaginado ser mais fácil de escalar.
 Depois de muito vagar pelo cemitério, o encontrou, duas vezes mais alto que o muro... Deu dois paços para traz e lamentou.
 Sentiu-se vigiada e se voltou aos túmulos. Então, em meio à tempestade, viu Flávio, trajado com o terno de noivo todo cheio de lama. Ele se aproximou de sua amada, segurou violentamente em seu pescoço e lhe indagou com a voz rouca:
― Não posso ficar com você, mas você pode vir e morrer comigo!
 Não havia mais vestígios de sã consciência no corpo morto de Flávio. Ele a atacou voraz, tentando abocanhar sua jugular.
 A noiva se desesperou, tentando encontrar forças para fugir do ataque grotesco. Já estava quase inconsciente, tamanha a violência daquelas mãos frias.
 Lamentou pelo que fez... Tolice querer trazer os mortos de volta!
 De súbito, achou forças e o empurrou pra trás. Flávio a encarou dizendo:
― Eu lhe prometi que seria pra sempre! Me deixe cumprir, meu amor!
 Eveline mesmo apavorada, ignorou o medo e escalou o portão, Flávio segurou em seu pé e insistiu:
― Morrer não é tão ruim assim, Eveline... Fica comigo!
Ela chutou seu rosto e respondeu antes de continuar a subida:
― Se morrer não é tão ruim, então continue morto!
 Conseguiu subir e descer até a calçada, olhou para dentro do cemitério e não mais o viu. Poderia ter sido tudo coisa de sua cabeça?
 Não, não era. Seu pescoço ainda doía devido a violência que Flávio a pegou. Adentrou no carro, respirou fundo, enxugou as lagrimas e saiu as pressas dali.

 Em uma esquina estava a cigana. De longe ela avistou o rapaz de terno sujo e o reconheceu. Com um sorriso, ia aproximando dele e perguntando:
― Menino... Você esta...
― Vivo? – terminou ele – Não. Não estou vivo! E nem a senhora vai estar!
 De repente, o carro de Eveline surgiu diante dos dois. Ela enxergou seu noivo no meio da pista e por instinto, se desviou, atingindo em cheio a velha cigana na calçada, batendo em seguida violentamente contra o muro.
As pernas da moça foram prensadas entre as ferragens do veiculo... Ignorando a dor, tentava entender a tudo aquilo, mas não conseguia.
Flávio surgiu, se aproximou do cadáver da velha cigana e depois caminhou até o carro de Eveline.    
 Presa entre as ferragens, a noiva com a cabeça sangrando encarou seu amado, mostrando medo, dor e desespero.
 Flávio arrancou a porta do veiculo e lhe encarou serio. Eveline gritou alto, mesmo sem ser ouvida, ousou em um ultimo grito.
 O noivo bruscamente segurou em seu pescoço e o apertou. Estagnada, encarou seu amado noivo morto lhe enforcar. Seus olhos ficaram vermelhos e ela se entregou, se entregou as promessas de seu amado... Para Sempre...

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