quarta-feira, 17 de abril de 2013

Só a saudade e boas recordações devem ficar


Ele aproximou-se dela, sorrateiro, sobressaltando-a. Ela deu um gritinho abafado e quase deixou cair o copo no chão. Pousou-o na mesa. Tinha ficado instantaneamente sem fala, tal a emoção. Depois recuperou a calma e olhou-o longamente. Estava naturalmente mais velho, mais cabelos brancos, mais rugas...
Beijaram-se na face.
- O que fazes por aqui no Rio?
- Vim com a minha mulher, a prometida viagem acabou por acontecer, não como eu esperava. Lamento...
Ela desviou o olhar para o fundo da sala, muita gente conversando animadamente, mas não via nada senão vultos. Estava tão longe dali...
- E tu, casaste?
- Não, continuo solteira e boa mãe.
- Entendi. Casei, como sabes, mas não tenho filhos.
Ele olhou-a, com o mesmo olhar penetrante que a tinha cativado anos atrás. Depois fez um gesto largo. - Bem, tenho de ir, a Patrícia está à espera, vês? - E apontou para a entrada do café. Ela olhou para a porta, onde uma mulher morena e bem vestida mas um pouco exuberante, maquilhada em demasia, parecia impaciente.
- Está bem, desejo-te toda a sorte do mundo.
- Eu também a ti, querido. - E beijou-o com intensidade na bochecha, tendo ele retribuído, mas fugazmente. Depois, afastou-se por entre as mesas apinhadas de gente e deu o braço à mulher que o aguardava, saindo do recinto.
Ela então recordou rapidamente o tempo que anos atrás haviam passado juntos, as juras de amor, as manhãs, tardes e noites de amor insaciável em que se tinham deliciado até quase desmaiar, tudo perfeito, eram duas metades, mas também recordou as brigas intermináveis, fortes e intensas como mar bramindo em ocasiões de tempestade. Ambos ferviam em gota de água, esse tinha sido o seu maior pecado. Amavam-se desmesuradamente mas não conseguiam controlar as emoções. E isso tinha sido fatal. Um dia foi demais. Se tivessem tido mais calma, mais controle...
Nunca mais quisera ninguém, o seu coração, o seu corpo seria sempre e só dele, mesmo que ele desrespeitasse o prometido e tive mais uma, cinco ou dez mulheres, para ela era-lhe indiferente. Era o amor da sua vida e não quebraria essa promessa por nada deste mundo...
De repente sentiu-se fraca, as pernas tremendo e se não tivesse apoiado as mãos no espaldar de uma cadeira teria caído no chão. Sentou-se e instintivamente levou a mão à testa. Estava febril. Tomou um antipirético com um pouco de água e aos poucos sentiu-se melhor. Olhou para a porta, procurando-o desesperadamente, sem sucesso pois já tinha saído há uns minutos. E então os seus olhos ficaram humedecidos. Possivelmente nunca mais o veria, o amor da sua vida. Como o tinha amado, como ainda o amava, Santo Deus...

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