terça-feira, 21 de janeiro de 2014

O último posto de gasolina

Era fim de tarde de uma sexta-feira. Cleber apressou-se para sair cedo do trabalho. Não estava ansioso para rever a esposa, muito pelo contrário, estava excitado com mais um encontro com sua amante. Pegou um atalho para chegar mais rápido ao apartamento dela, uma estrada estreita onde poucos carros trafegavam. Ao longe avistou um caminhão que havia tombado. Tinha ficado atravessado diagonalmente impedindo qualquer carro de seguir viagem. Como conhecia muito bem aquela área, rapidamente manobrou o carro e pegou um desvio, à esquerda. Sabia que o caminho era mais longo, porém era melhor do que voltar e pegar um engarrafamento.

Olhou para o marcador de combustível. O tanque estava um pouco abaixo de ¼. Era suficiente para chegar ao apartamento, mas dificilmente permitiria voltar para casa pegando a avenida principal no retorno. Estava preocupado, pois não havia postos de gasolina naquela região. Tentou não acelerar muito o carro e seguiu com extrema cautela. Nas ladeiras, desligava o motor e seguia na banguela para economizar. Rapidamente a noite caiu. Na metade do caminho, para sua surpresa, avistou um posto de gasolina na margem direita da estrada.

Estava confuso. Tinha certeza de que não havia postos por ali. Por certo era novo. Além disso, era bem improvisado, tinha apenas uma bomba e uma pequena cabine de madeira onde ficava o frentista. Exultante, estacionou o carro e retirou a carteira do bolso.
- Complete, por favor.

O frentista repousava numa velha poltrona dentro da cabine. Sequer ergueu a cabeça, limitando-se apenas em abrir um dos olhos para identificar o seu freguês. Fechou-o, deu um longo suspiro, e com muito esforço ergueu seu esquelético corpo, segurando-se no balcão.
- Aonde vai, patrão?

Cleber não entendeu muito bem a pergunta, pois estava examinando a água do radiador. Voltou-se para o frentista, limpando suas mãos com uma flanela.
- Desculpe, o que foi que perguntou?
- Para onde está indo a essa hora?
- Tenho um compromisso, mas acredito que não seja do seu interesse. – respondeu ele, sentindo-se insultado.

O frentista balançou a cabeça negativamente. Terminou de abastecer o tanque e recolocou a mangueira no seu lugar. Olhou mais uma vez para Cleber e deixou escapar um sorriso irônico.
- Quanto deu?
- Por conta da casa – respondeu o frentista, voltando para a cabine.
- Deixe de conversa, meu senhor. A gasolina é caríssima nesse país. Você colocou praticamente um tanque inteiro. Vou deixar o dinheiro no balcão. Se não quiser pegar, é problema seu.

Voltou para o carro e arrancou em primeira marcha. Alguns metros à frente olhou pelo retrovisor, e estranhamente não viu o posto de gasolina. Ficou indignado ao perceber que o marcador de combustível ainda indicava ¼ de tanque. Sabia que iria ficar pelo caminho a qualquer momento.

Acelerou o carro o máximo que podia. Já havia cruzado dez quilômetros de estrada, e o ponteiro não havia se mexido um mililitro sequer. “Deve estar com defeito”, pensou ele. Fez uma curva em altíssima velocidade. O carro quase derrapou, mas manteve a aderência. Se continuasse naquele ritmo, chegaria no apartamento da amante em vinte minutos.

Para o seu azar, o carro começou a dar uns trancos e a perder velocidade. O marcador havia se mexido e estava no ponto vermelho. Estava sem gasolina. Pensou em encostar o carro, mas viu na margem direita outro posto de gasolina, igual ao que abasteceu seu carro anteriormente.

Lá estava, a mesma cabine feita de madeira, e ao lado, a única bomba de combustível. Chegou ao balcão e viu o mesmo frentista repousando na poltrona. Ele repetiu o mesmo gesto, abriu um dos olhos para identificar o seu freguês, e com muita preguiça ergueu-se da poltrona se segurando no balcão.  Mas desta vez não disse nada. Apenas abasteceu o carro e limpou o pára-brisa.  Cleber não acreditava no que estava acontecendo. Pensou que talvez estivesse errado o caminho e voltado para a mesma estrada.

- Ficou calado agora... O que houve, meu senhor? Não quer mais puxar conversa?
- Não preciso puxar conversa. Eu apenas pergunto aonde o freguês quer ir. Minha gasolina não é comum, pelo contrário, é especial. Mesmo se você quiser cruzar o país, poderá fazê-lo com um único tanque. Só que no seu caso tem um sério problema.
- Qual seria o problema? A minha mulher mora alguns quilômetros adiante, por que a gasolina acabou tão rápido?
- Você não disse para onde ia... Deu uma resposta vaga, e até foi grosseiro. Sinto muito por você.
- Como assim? O que vai acontecer comigo?
- Jamais vai chegar ao seu destino. A gasolina vai acabar e sempre vai acabar retornando ao meu posto.
- Você deve estar maluco. Pegue a grana! Preciso sair logo desse lugar.

O frentista voltou para a sua cabine e deixou seu corpo desabar na velha poltrona. Incrédulo, Cleber seguiu viagem. Sequer completou dez quilômetros de viagem e logo sua gasolina acabou. Mas para seu terror, logo à frente estava o velho posto de gasolina

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