quinta-feira, 20 de junho de 2013

O homem '' Perfeito''


"Nada é tão bom como o amor, nem tão verdadeiro como o sofrimento."
                                                        Alfred de Musset


"A dor é tão necessária como a morte."
                                                        Voltaire


"Sentimos a dor mas não a sua ausência."
                                                        Arthur Schopenhauer



O HOMEM PERFEITO


Rodrigo não hesitou, apertou o gatilho. Sentiu toda sua fúria e raiva ser liberada. Agora ele tinha o poder, agora ele era o mais forte.

“Não desejar a mulher do próximo”. Disse para si enquanto viu a bala atingir a cabeça do homem postado à sua frente.

E lá se foi aquele estranho, um desconhecido, sem nome. Mas seu nome não importava para Rodrigo, o nome era apenas uma palavra, apenas um detalhe. Já o tiro, bem, o tiro era a consequência dos atos, atos sujos, de má fé, praticados por aquele que agora estava morto.

Depois Rodrigo encarou Ana. Pálida, apavorada. Chorava e tentava esconder o corpo no em meio as cobertas. Rodrigo pensou no quão cômico era aquele ato, os dois viviam juntos a mais de dez anos, a vergonha diante a nudez não existia a tempos. Mas as coisas mudaram, agora ele era outro homem.

Rodrigo nunca imaginou que Ana seria capaz de fazer isso com ele. A mulher parecia lhe amar do mesmo modo que ele a amava, com um amor sem medidas. Mas as vezes me parece, que a verdadeira paixão nunca é mutua.

Com a arma ainda apontada para o corpo estendido daquele estranho, que agora pairava todo ensanguentado ao lado de Ana, nosso personagem principal sorriu e chorou.

Por que a vida fora tão injusta com ele?

Ele que sempre foi um homem bom, que nunca havia feito mal a ninguém, que sempre tentava ajudar os outros e satisfazia todos os desejos de sua mulher, a tratando como uma princesa durante todo o tempo que estavam juntos. Por quê?

A resposta era o silêncio, e esse representava apenas uma coisa: Essa é a vida, a realidade!

Realidade "crua e muda" segundo o poeta Fernando Pessoa.

Tomado por um pessimismo schopenhaueriano, Rodrigo respirou fundo e concluiu que ser muito bom nos dias de hoje não é tão correto assim, não é o melhor para um homem. Toda sua perfeição diante à família, à esposa, só lhe trouxe dor e agora também o título de assassino.

Muitos homens não se importam de matar e outros matam até sem saber o porquê. Rodrigo foi consciente diante a sua decisão de tirar a vida de outra pessoa. Vinha planejando isso a pelo menos uma semana. Ele que nunca havia colocado a mão em uma arma de fogo estruturou um plano para acabar com aquela merda toda que havia descoberto.

Tudo começou no dia em que viu as mensagens no celular da mulher, mensagens sujas, pervertidas, de um contato que não tinha nome. Depois disso ele encontrou roupas do outro homem guardadas em seu próprio guarda-roupas. E então, na tentativa de jogar verde para colher maduro, Rodrigo apodreceu.

Mentiu para sua mulher, foi sua primeira mentira. Mentiu que iria para o trabalho e não foi. Trinta minutos depois que sairá de casa viu o amante chegando. Era um rapaz mais jovem que ele, parecia ter uns 26 anos. Ana o receberá como um amigo, no portão, na frente de toda a vizinhança. Á distância Rodrigo observou tudo, se desequilibrando, deixando de ser aquilo que sempre fora.

Como ela podia fazer aquilo com ele?

Com o coração quebrado Rodrigo deu início ao seu plano, decidiu que em breve tudo aquilo acabaria.

No dia seguinte foi até uma loja de armas de um amigo que não via a mais de cinco anos. O amigo estranhou a compra, mas assim mesmo a fez. Comercialização realizada por baixo dos panos, a doses de amizade misturada com uma boa quantia de dinheiro.

Com a posse de um revólver calibre 38, Rodrigo achou um lugar deserto para treinar os tiros e fez isso com dedicação durante três dias. Tudo porque queria acertar direto na cabeça do filho da puta. Treinou e aprendeu a atirar como um verdadeiro soldado. Milagres acontecem.

Corrompeu-se e aguardou por mais seis dias, seis longos dias para então ter uma oportunidade de faltar o trabalho novamente e pôr em prática seu plano. Seu coração se tornara temporariamente negro.

Nesses dias ele agiu normalmente com sua mulher, segurando-se para não jogar tudo na cara dela. Precisou ser forte, pois aquilo não era fácil. Estava acostumado a ver apenas o que sua mulher queria.
Uma dos piores momentos veio em uma fria noite de quarta-feira, dois dias antes da tragédia.

O casal na cama, já passavam das dez horas. Ana foi para cima dele, tentou seduzi-lo, mas Rodrigo não caiu na dela. Não tinha mais um pingo de tesão por aquela que durante tanto tempo admirara.

A mulher vendo a rejeição do homem o abraçou e sussurrou no seu ouvido.

"Eu te amo pra sempre."

Aquilo fez Rodrigo sentir nojo do ser humano. Não entendia como uma pessoa brincava assim com os sentimentos dos outros, parecia até um pesadelo.

Fechou os olhos, com a esperança de abri-los novamente e sua vida ter voltado ao normal, mas nada aconteceu, aquela era a verdadeira realidade, e no fundo ele já sabia disso. Dormiu, sendo abraçado pelas frias mãos de uma mulher mentirosa, dissimulada. Uma serpente humana.

Chegou o sábado, o grande dia. Rodrigo fez novamente sua atuação, fingiu que havia saído com o carro para ir até o trabalho, e apenas deu algumas voltas pela cidade. Dirigiu sem olhar para estrada, as ruas seguiam apenas a linha reta. E depois de meia hora voltou a seu bairro.

Deixou o carro estacionado duas quadras de sua residência e partiu encontrar a mulher e o amente. Seguiu à pé, andando calmamente com o 38 guardado no bolso do casaco. A cada passo seu corpo parecia pesar mais, a cada passo a covardia, sentimento que ele ignorava desde a infância, tentava gritar mais alto que o orgulho, que a vontade de fazer a puta da Ana pagar.

Tirou a chave do bolso mostrando que era mais forte, abriu a porta da frente e entrou. Da sala ouviu os barulhos que vinham do quarto. Os dois desgraçados já estavam se pegando.

Com a arma carregada se dirigiu até o quarto, chutou a porta, como esses policias fazem em filmes e pegou a mulher em cima do amante. Galopava com força. Ambos gemiam perdidos em êxtase.

Com o susto os dois amantes se separaram e antes que um deles pudesse se pronunciar Rodrigo mirou. Mirou bem na testa do cara que estava comendo sua esposa.

Um tiro e o sangue se espalhou pela cabeceira da cama.

Ana começou a chorar e depois de se esconder implorou ao marido que parasse, implorou à aquele que parecia ser um estranho. Mas não tinha mais volta, ela também precisava pagar.

- Eu te amei para sempre..." Foi a frase que Rodrigo sussurrou com uma voz fria e áspera.

Lúcia viu um brilho nos olhos do homem que ela trairá e então... Rodrigo apertou o gatilho, pela segunda vez.

“Não levantar falso testemunho.”

A cena era macabra. Lençóis e paredes com manchas de sangue. Mas a raiva ainda não havia passado e para completar, Rodrigo despachou outros seis tiros, distribuindo esses para os dois corpos já atingidos, na tentativa de lavar sua alma.

Após isso sentou-se na cama e olhou para o 38 em sua mão.

Recarregou a arma e a colocou na sua própria cabeça. O cano quente aqueceu alguns fios de cabelos.

Nada fazia sentido.

Pressionando o 38 em seu têmpora, pensou sobre a vida, pensou em tudo o que lhe acontecera.  Desanimou-se, sentiu a dor de ser enganado.

A cabeça latejava, o coração batia mais rápido que nunca.

O dedo dançou pelo gatilho, aguardando a decisão do coração e da mente, que vinham a uma semana trabalhando separadas, de forma independente.

O tiro poderia vir em apenas dez segundos, ou quem sabe só depois de uma eternidade.

Em um quarto qualquer, com a companhia de dois cadáveres e muitas dúvidas, o homem perfeito se perguntava:

"Morrer ou deixar-se morrer, eis a questão.".

Pobre Rodrigo...
Eu realmente torço para que você tome a melhor decisão.

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