sábado, 29 de junho de 2013

O mistério na vila

De boca em boca corria a história. Afinal, em todo vilarejo que se preze, sempre há mistérios e "causos" inexplicáveis de assustar a população. Alguns diziam que por lá andava o saci-pererê, outros falavam em assombrações. Havia até quem jurasse ter visto a mula-sem-cabeça.  Mas que havia algo intrigante e assustador em certo local, certamente havia. As pessoas até evitavam sair de casa à noite.

 A fábrica de papel lá existente, onde meu pai trabalhava, funcionava ininterruptamente. Havia uma troca de turnos à meia-noite, hora que, por si só, já traz certa inquietação. Entre os trabalhadores que neste horário deixavam a fábrica, reinava o medo certa época. Só havia duas opções de retorno para casa. Um grupo ia para direita, outro para a esquerda, na única longa rua existente, ladeada por um fechado bosque que se estendia até a beira de um riacho. Do outro, os morros desabitados. A precária iluminação instigava medos.

 Aconteceu que um barulho, indescritível e assustador, volta e meia  era ouvido pelos que passavam por certa curva do caminho. Os operários logo se apressavam, apavorados, indo em grupos. Falava-se também em algum temido bicho do mato ou das trevas. Tal som vinha do interior da mata, cuja escuridão impedia qualquer visão. Um crescente medo apoderou-se da vila, pela frequência com que se repetia. Algo tinha que ser feito! Até velas já haviam acendido por lá.

 Até que um dia, alguns valentes homens decidiram que entrariam na mata para averiguar tal ameaça. Assim combinado, assim feito. Iriam na próxima vez que o estranho som fosse ouvido. Tarefa fácil reunir o grupo, pois todos moravam próximos. Difícil era encontrar os valentes...

 Certa noite, o alarme. O "bicho", a "coisa", "alma penada", ou fosse lá o que fosse, manifestou-se. O grupo se reuniu e para o tal lugar dirigiu-se, portando lanternas, pedaços de pau e até mesmo armas de fogo. Chegaram. Difícil decidir quem se embrenharia primeiro pela mata. Enfim, em silêncio, pé ante pé, foram avançando. Qualquer ruído produzido pelo pisar em algum galho no chão provocava medo e recuo. Soprava o vento, e as sombras e os galhos das árvores já os assustavam. A esta altura, todos estavam prontos ou para o ataque... ou para a fuga, o que alguns já haviam feito. O grupo reduzia-se à medida que na mata adentravam. No ar, um uivo, um silvo intermitente, ecoando terror na noite. Alguém falou em lobisomem, aumentando o temor. A valentia se encolheu. Mas, armas em punho, por entre arbustos, caminhavam os mais destemidos.

 Finalmente aproximaram-se o suficiente para divisar um grande vulto negro a mover-se na mata. Então era verdade! Realmente algo desconhecido ali se encontrava, junto a uma bananeira. Alguém atirou. Alguns avançaram com seus pedaços de pau nas mãos, outros voltaram em disparada. O "vulto" não foi atingido pelo tiro, porém veio justo em direção ao apavorado grupo. Pânico geral! E qual não foi a grande surpresa! A tão temida "coisa" nada mais era que... um cavalo, esbaforido, que ficava a coçar-se esfregando-se na bananeira, produzindo o estranho som. Quase mataram o pobre animal, cuja pacífica missão era diariamente puxar a carroça que recolhia o lixo, e ali, tranquilamente, pastava...

 No dia seguinte, todos riam e se vangloriavam de terem bravamente desvendado o intrigante caso da "coisa" que tanto inquietara o lugarejo... Restaurou-se a paz, até o "causo" seguinte, quando, numa noite de lua-cheia...

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